Abordagem

O prolapso de órgãos pélvicos (POP) não é, via de regra, uma emergência, a menos que tenha causado retenção urinária aguda. Nesse caso, um cateter de Foley de demora deve ser colocado até que o prolapso possa ser tratado. As opções de tratamento devem ser discutidas com a paciente e a estratégia de intervenção deve ser adaptada para levar em consideração os sintomas da paciente, a anatomia do assoalho pélvico, os achados de investigações adicionais, se indicadas, e a preferência da paciente.[28]​ Todas as pacientes devem receber opções de tratamento conservador (não cirúrgico); o tratamento cirúrgico pode ser oferecido às mulheres com POP sintomático que não tiverem respondido ou recusarem abordagens não cirúrgicas.[22][36]​​

Pacientes assintomáticos

As pacientes assintomáticas, ou mulheres que tiverem apenas alguns sintomas leves, mas esvaziamento suficiente da bexiga e função renal normal, podem relatar pouco ou nenhum inconveniente como resultado do distúrbio. Observação ou vigilância ativa são apropriadas para essas mulheres, com educação para garantir que elas entendam a possível relação entre o prolapso e a disfunção da miccional ou defecatória.[22]

O treinamento dos músculos do assoalho pélvico (MAP) pode ser oferecido, apesar da falta de dados de qualidade que sustentem seu uso para prevenir a progressão.[37][38]​ Dados cumulativos mostram que o treinamento de MAP tem um efeito significativo no estágio do POP e na morfologia do MAP.[37] Vários estudos demonstraram que o treinamento de MAP para prolapso é eficaz na melhora dos sintomas de prolapso.[37][39][40]​ Um treinamento supervisionado e mais intensivo é mais efetivo que o treinamento não supervisionado. São necessários mais ensaios clínicos randomizados e controlados de alta qualidade a fim de avaliar melhor o efeito do fortalecimento dos MAP no POP.[37][38][41]

Manejo conservador em pacientes sintomáticos

Suportes mecânicos, como pessários vaginais, são usados para restaurar os órgãos prolapsados à sua posição normal e, assim, aliviar os sintomas.[36]​​​[42]​​​​​​ Uma grande variedade de pessários está disponível para tratamento do prolapso. Os pessários são mantidos no lugar pela musculatura do assoalho pélvico e são feitos de silicone médico. Este tratamento pode ser oferecido às mulheres com POP sintomático que recusarem a cirurgia, forem candidatas inadequadas à cirurgia devido a comorbidades clínicas, planejarem novas gestações no futuro ou precisarem de alívio temporário de um prolapso ou incontinência relacionados a uma gravidez.

O ajuste é feito por tentativa e erro e é afetado pela experiência do médico, se a mulher deseja ser sexualmente ativa e qual tipo de pessário é retido, confortável e permite que a mulher urine com o pessário no lugar. O acompanhamento regular e a adesão às instruções de cuidados com o pessário são importantes. Os pessários têm altas taxas de satisfação e baixas taxas de complicações.[42]

Caso haja o desenvolvimento de erosão vaginal em uma mulher com pessário, este deve ser removido e deve-se aplicar creme de estrogênio até que a erosão seja curada. A resolução pode ocorrer sem terapia com estrogênio local. O pessário pode então ser substituído, embora um pessário diferente possa ser considerado.[22]

Cirurgia

A cirurgia é indicada se os sintomas problemáticos persistirem apesar do manejo conservador.[28]​ Os objetivos do tratamento devem se concentrar na restauração das funções urinária, defecatória e sexual. A abordagem cirúrgica pode ser reconstrutiva versus obliterativa, abdominal versus vaginal, ou aberta versus minimamente invasiva. O tipo de cirurgia deve ser individualizado, de acordo com a experiência do cirurgião e as preferências, estilo de vida, doenças concomitantes e idade da paciente. Vários outros fatores também devem ser considerados ao aconselhar as pacientes sobre a escolha do tratamento cirúrgico:

  • Durabilidade

  • Tempo de recuperação

  • Complicações pós-operatórias imediatas e proteladas

  • Taxa de reoperação

  • Incontinência urinária por esforço concomitante

  • Risco de corpo estranho: podem ocorrer erosões, granulação de ferida e dispareunia após o reparo do prolapso vaginal com materiais de enxerto; a incidência dessas complicações varia amplamente de um estudo para outro[43]

  • Desejo de futura fertilidade ou penetração vaginal. A maioria dos especialistas prefere adiar a cirurgia para POP até que a prole esteja completa; nos EUA, o útero é removido durante quase todos os procedimentos para POP primário.

A terapia comportamental perioperatória pode ser realizada, embora não afete os desfechos cirúrgicos.[44]​ Outras intervenções, como preparação intestinal e inserção de stent ureteral, não demonstraram reduzir as complicações operatórias.[45]

Cirurgia reconstrutiva versus cirurgia obliterativa

  • Procedimentos reconstrutivos para restaurar o útero prolapsado e a anatomia normal (por exemplo, sacrocolpopexia, sacro-histeropexia, suspensão do ligamento uterossacro, fixação do ligamento sacroespinhal e colporrafia) são oferecidos a todas as pacientes sintomáticas e são recomendados para aquelas que gostariam de manter a atividade sexual, porque os procedimentos obliterativos (por exemplo, colpocleise ou colpectomia) estreitam ou fecham parcialmente o espaço vaginal.

  • A histerectomia simples sem reconstrução das anormalidades de suporte no ápice vaginal é insuficiente para a resolução dos sintomas. A suspensão do ápice vaginal deve ser realizada ao mesmo tempo em que a histerectomia, para reduzir o risco de prolapso recorrente.[22]

  • Os procedimentos de fixação do ligamento sacroespinhoso, incluindo a histeropexia do ligamento sacroespinhoso e a suspensão do ligamento uterossacro, com ou sem histerectomia, apresentam as mesmas vantagens para o tratamento do prolapso apical vaginal.[22][46][47][48]​​​ O reparo do tecido nativo é realizado por via vaginal. Caso a prioridade seja a minimização dos eventos adversos ou das reoperações, recomenda-se a abordagem vaginal com reparo do tecido nativo.[49]

  • A sacrocolpopexia, para tratar o prolapso da cúpula vaginal, pode ser realizada por meio de abordagem abdominal aberta ou laparoscópica minimamente invasiva, com ou sem assistência robótica.[50][51][52]

  • A sacrocolpopexia assistida por robô apresenta uma taxa de curas que varia de 84% a 100%; os desfechos relacionados à cirurgia melhoram com o aumento da experiência.[52] Um estudo que avaliou a custo-efetividade e a reinternação (dentro de 6 semanas) da sacrocolpopexia laparoscópica em comparação com a sacrocolpopexia robótica encontrou desfechos e taxas de complicações semelhantes em ambos os grupos.[53]

  • A sacrocolpopexia pode ser realizada com uma malha sintética ou um enxerto biológico.

  • A sacro-histeropexia (abdominal ou laparoscópica), com malha sintética, é um tratamento alternativo para as mulheres que não desejam fazer histerectomia.

  • A cirurgia vaginal anterior e/ou posterior concomitante (por exemplo, com colporrafia) não deve ser considerada rotineiramente, mas deve ser baseada nos defeitos anatômicos após o reparo do ápice.[54][55]

  • Uma cirurgia obliterativa, como a colpocleise parcial (Le Fort) e a colpectomia total, pode ser oferecida aos pacientes com alto risco de complicações (por exemplo, aquelas com doença sistêmica grave ou pacientes mais idosas que não forem sexualmente ativas e preferirem evitar cirurgias mais agressivas) e/ou que não desejarem manter a permeabilidade vaginal. Uma revisão da colpocleise relatou uma taxa de sucesso de quase 100%.[56]

Complicações

  • As possíveis complicações da cirurgia para POP incluem hemorragia intraoperatória, lesão vesical, lesão retal ou do intestino delgado e dor intensa no glúteo que irradia para a parte posterior da perna devida a encarceramento do nervo ciático.

  • O sangramento pré-sacral, embora incomum, é a complicação intraoperatória mais preocupante associada com os tipos laparoscópico e aberto da sacrocolpopexia, e pode ter consequências com risco á vida. As complicações associadas à sacrocolpopexia aberta incluem cistotomia (3.1%), enterotomia (1.6%), problemas incisionais (4.6%), íleo paralítico (3.6%), eventos tromboembólicos (3.3%) e necessidade de transfusão (4.4%).[57][58][59]

  • Atualmente, não há produtos de malha transvaginal aprovados pela Food and Drug Administration (FDA) dos EUA para o tratamento do POP. A FDA dos EUA tem recebido centenas de relatos de complicações envolvendo o uso de malha no reparo transvaginal do POP, incluindo infecção, sangramento, dor pélvica, dor durante a relação sexual, perfuração de órgãos e problemas urinários em decorrência de erosão da malha para os tecidos circundantes. Em 2019, a FDA solicitou a retirada da prática o uso de malhas vaginais para reparo de POP e ordenou que os fabricantes de todos os kits de malhas transvaginais restantes para reparo de POP parassem de vender e distribuir seus produtos nos EUA imediatamente.[60]​ O National Institute for Health and Care Excellence do Reino Unido não recomenda mais o uso de malha vaginal para o reparo de POP.[28][61]

  • A lesão ureteral é a complicação mais frequentemente relatada após a suspensão do ligamento uterossacro, e foi mais comum em comparação com a fixação sacroespinhal.[59]

  • Aproximadamente 40% das mulheres com prolapso apical ou anterior que não apresentam incontinência desenvolvem incontinência urinária pós-operatória, e pode ser necessário tratamento adicional.[19][28]

Cirurgia para incontinência concomitante

  • Até 80% das mulheres com POP apresentam incontinência urinária coexistente.[19][62]​​​​ Se os sintomas forem incômodos, o POP e a incontinência urinária por esforço podem ser tratadas simultaneamente para reduzir uma incontinência urinária de esforço persistente ou agravada após a cirurgia para prolapso.[22]​ A via de acesso para reparo de prolapso determina o tipo de procedimento de continência.[19][63]

  • As pacientes com POP que não apresentam incontinência urinária por esforço devem ser informadas de que o risco de incontinência urinária por esforço "de novo" é maior se um procedimento de continência não for realizado, mas o risco de efeitos adversos aumenta com um procedimento adicional.[19]​ A colpossuspensão de Burch concomitante à sacrocolpopexia abdominal e o sling uretral médio retropúbico concomitante à cirurgia vaginal para reparo de POP reduzem o risco de incontinência urinária por esforço pós-operatória nas mulheres sem incontinência pré-operatória.[63][64][65]​​​​​​ [ Cochrane Clinical Answers logo ] ​​ Na maioria dos estudos disponíveis, os dados são insuficientes para afirmar se um procedimento de continência concomitante afeta as taxas de POP recorrente, a necessidade de cirurgia adicional ou a bexiga hiperativa pós-operatória.[63]​ O National Institute for Health and Care Excellence do Reino Unido não recomenda a cirurgia para prevenir incontinência em mulheres que tiverem passado por cirurgia para prolapso e não tiverem incontinência.[28]

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