Abordagem

Como a nocardiose é uma doença rara, a escolha do medicamento, sua administração e a duração do tratamento não foram bem estabelecidas em ensaios clínicos.[43]​ A maioria das recomendações se baseia nos resultados de pesquisas básicas, modelos animais e opiniões clínicas de especialistas.

Embora o tratamento deva ser orientado pela espécie de Nocardia e testes da suscetibilidade, geralmente os médicos começam o tratamento de forma empírica, enquanto os resultados ainda não estão disponíveis. As sulfonamidas (por exemplo, sulfametoxazol/trimetoprima) têm sido os agentes de escolha para o tratamento da nocardiose há mais de 60 anos. Dependendo do quadro clínico, da evolução da doença e do local do corpo envolvido, também pode ser necessário realizar um tratamento cirúrgico adjuvante.

Tratamento clínico inicial para pacientes com doença grave

A doença considerada grave é a doença disseminada, com envolvimento do sistema nervoso central (SNC) ou doença pulmonar com sinais de infecção extensa. Embora as sulfonamidas tenham sido classicamente o medicamento de primeira escolha, os pacientes com doença grave são normalmente tratados com uma combinação de dois ou três medicamentos. A terapia combinada é usada tanto para garantir uma cobertura antimicrobiana adequada quanto devido à possível sinergia entre os antibióticos.[62]

Para o tratamento da doenças grave, alguns especialistas recomendam um esquema triplo que consiste em sulfametoxazol/trimetoprima, amicacina e carbapenêmico (por exemplo, imipeném/cilastatina). Alternativamente, um esquema de dois medicamentos pode ser recomendado para a doença grave que não envolva o SNC, como sulfametoxazol/trimetoprima associado a amicacina ou imipeném/cilastatina, ou imipeném/cilastatina associado a amicacina. A linezolida é outra opção a ser incluída em um esquema inicial para a doença grave.[43]

Sulfonamidas

  • As sulfonamidas são consideradas um medicamento de primeira escolha para a nocardiose. O sulfametoxazol/trimetoprima alcança boa penetração no SNC e tem boa biodisponibilidade quando administrado por via oral.

  • No entanto, estes medicamentos estão associados a uma elevada incidência de eventos adversos, tais como reações alérgicas, lesão renal aguda, hipercalemia, toxicidade hematológica e náuseas intensas.[63]​ Recomenda-se o monitoramento para toxicidade renal, distúrbios eletrolíticos e toxicidade hematológica durante o tratamento.

  • A resistência às sulfonamidas é possível com algumas espécies de Nocardia. Por exemplo, a Nocardia farcinica é comumente resistente a sulfametoxazol/trimetoprima.

Linezolida

  • A linezolida, um antibiótico da classe das oxazolidinonas, demonstrou forte atividade in vitro contra a maioria das espécies de Nocardia e cepas testadas.[64] Além disso, a linezolida tem grande biodisponibilidade oral e pode penetrar o SNC.[65][66]​ Há crescentes evidências para apoiar o uso de um esquema que contenha linezolida no tratamento da nocardiose, inclusive entre pacientes com comprometimento do SNC, embora alguns médicos tenham levantado preocupações no sentido de que a variedade de efeitos adversos graves pode limitar seu uso disseminado.[62][67][68][69]

  • Um estudo retrospectivo de 2019, realizado com 20 pacientes com nocardiose moderada a grave, constatou que o tratamento empírico inicial com um esquema que contendo linezolida foi, pelo menos, tão seguro e efetivo quanto outros agentes de primeira linha. Nesse estudo, os efeitos adversos mais comuns foram trombocitopenia e anemia; no entanto, os efeitos adversos que exigiram a descontinuação do tratamento foram mais comuns nos pacientes tratados com sulfametoxazol/trimetoprima que com a linezolida.[70] Outro pequeno estudo relatou que 45% dos pacientes desenvolveram mielossupressão e 18% desenvolveram neuropatia como efeito adverso do tratamento com linezolida para nocardiose.[68] Outros efeitos adversos associados à linezolida, relatados em uma pequena série de pacientes que receberam tratamento para nocardiose, incluem neurite óptica e acidose láctica.[65][67]​​ A duração do tratamento e a presença de fatores preexistentes (por exemplo, doença neurológica subjacente, tratamento com quimioterapia, diabetes, transtornos decorrentes do uso de bebidas alcoólicas) parecem aumentar o risco de desenvolvimento de complicações neurológicas.[71] Também foi relatado que o risco de trombocitopenia aumenta quando linezolida é usada por mais de 10 dias.[72]

  • O risco de complicações hematológicas e neurológicas pode limitar o uso da linezolida a cenários hospitalares monitorados e a tratamentos empíricos iniciais. Recomenda-se um monitoramento cuidadoso para essas complicações durante o tratamento.

Amicacina

  • A amicacina, um antibiótico aminoglicosídeo, muitas vezes é incluída nos esquemas de tratamento empírico inicial devido às altas taxas de suscetibilidade em  espécies de Nocardia. No entanto, seu uso está associado com potenciais nefrotoxicidade e ototoxicidade, incluindo disfunção vestibular e perda auditiva irreversível.

  • Recomenda-se o monitoramento cuidadoso dos níveis séricos de amicacina e para sinais de nefrotoxicidade e ototoxicidade durante o tratamento com amicacina, especialmente se a duração do tratamento for prolongada.

  • A amicacina atinge uma penetração fraca no SNC, portanto um esquema de dois medicamentos contendo este medicamento pode ser insuficiente para o tratamento da doença do SNC.

Tratamento clínico inicial para pacientes com doença pulmonar não grave

A doença pulmonar não grave pode ser tratada com monoterapia de sulfametoxazol/trimetoprima, ou com um esquema de dois medicamentos que consiste em sulfametoxazol/trimetoprima associado a outro agente, como ceftriaxona, ciprofloxacino, moxifloxacino, linezolida ou minociclina.[21][43]​ A escolha da antibioticoterapia é orientada pelo médico responsável pelo tratamento e depende de se a infecção é leve ou moderada.

Tratamento clínico inicial para pacientes com doença cutânea

A nocardiose cutânea pode ser tratada com sulfametoxazol/trimetoprima em monoterapia, ou a terapia combinada com sulfametoxazol/trimetoprima associado a outro agente (por exemplo, moxifloxacino, ciprofloxacino, imipeném/cilastatina, linezolida) é recomendada para o micetoma ou se houver envolvimento tecidual profundo ou extensão para o osso.[12][43][73][74]​​​ Demonstrou-se que o imipeném/cilastatina é efetivo para actinomicetomas causados por Nocardia refratária a sulfonamidas.[75]

Tratamento de acompanhamento

Após iniciada a terapia empírica, o tratamento deve ser orientado pelos resultados da identificação da espécie de Nocardia e testes de suscetibilidade.[43]​ Quando os resultados dos exames de tipagem e sensibilidade estiverem disponíveis, o tratamento deve ser direcionado a esse isolado. Após a melhora clínica do paciente, os agentes orais podem ser considerados para a terapia de acompanhamento. Medicamentos potencialmente úteis, de acordo com as espécies envolvidas, são as cefalosporinas (por exemplo, ceftriaxona), outros betalactâmicos (por exemplo, amoxicilina/ácido clavulânico), sulfametoxazol/trimetoprima, minociclina, fluoroquinolonas (por exemplo, ciprofloxacino, moxifloxacino), linezolida e carbapenemas (por exemplo, meropeném, imipeném/cilastatina, ertapeném). A maioria dos isolados de Nocardia farcinica é resistente a cefalosporinas, mas as cefalosporinas são altamente ativas contra N asteroides tipo VI, N nova e N abscessus. Essa última espécie é mais frequentemente resistente a imipeném/cilastatina. A N cyriacigeorgica também foi relatada como resistente a imipeném/cilastatina.[46][76]​​​ Como a suscetibilidade para diferenciar carbapenemas muda segundo as diferentes espécies de Nocardia, pode haver utilidade em testar a suscetibilidade de Nocardia a imipeném/cilastatina, meropeném e ertapeném.[77] As fluoroquinolonas são ativas contra a maioria das cepas de N farcinica e N brasiliensis. A N brasiliensis frequentemente também é suscetível a amoxicilina/ácido clavulânico.[8] No entanto, como os padrões de resistência dentro da mesma espécie podem diferir, o tratamento será individual para cada paciente e não pode ser padronizado.

Duração do tratamento e profilaxia secundária

A duração da terapia é variável e depende da localização das lesões e do estado imune do paciente. A nocardiose cutânea primária pode ser tratada por 3 a 6 meses. No entanto, o micetoma requer uma terapia mais prolongada. A nocardiose pulmonar e disseminada sem envolvimento do SNC deve ser tratada por pelo menos 6 meses.[20] Para pacientes com envolvimento do SNC, a duração do tratamento depende das respostas clínicas e das imagens, mas geralmente o tratamento deve ser mantido por 1 ano ou mais. Nos pacientes infectados pelo HIV com baixa celularidade de células T CD4 e pacientes que tiverem recebido transplantes, a profilaxia secundária com um agente oral ativo precisa ser mantida até a melhora do estado imune.[30]

Tratamento cirúrgico

Alguns sítios de nocardiose podem exigir um tratamento cirúrgico adjuvante, sobretudo para os pacientes com abscessos cerebrais. No entanto, a abordagem ideal de tratamento não foi estabelecida, e abscessos cerebrais por Nocardia têm sido manejados de forma conservadora com aspirações, ou com craniotomia aberta e enucleação.[54][78][79]​ Portanto, cada caso precisa de uma cuidadosa avaliação multidisciplinar realizada pelo médico primário, pelo especialista em doenças infecciosas e pelo cirurgião. A cirurgia ou a broncoscopia também podem ser consideradas para drenar abscessos pulmonares ou empiemas.[7]

Algumas vezes, lesões cutâneas e micetomas podem requerer tratamento cirúrgico, bem como algumas infecções oculares e casos raros com envolvimento de outras partes do corpo.[80][81][82][83][84][85]

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