Complicações
A síndrome do desconforto respiratório (SDR) é secundária à imaturidade pulmonar e à deficiência de surfactantes, ocorrendo com maior frequência quanto menor for a idade gestacional. Administração de corticosteroides pré-natal e surfactante no pós-parto reduz o impacto da SDR.[83][119][120] As consequências em longo prazo da SDR, como a displasia broncopulmonar ou a doença pulmonar crônica (DPC) ainda são um problema de saúde significativo.[121]
Infecção é uma das causas mais comuns de nascimento pré-termo e é uma causa de morbidade neonatal. A incidência é mais alta (aproximadamente 25%) na maioria dos bebês prematuros. A probabilidade de sepse pós-parto aumenta quanto menor a idade gestacional e a necessidade de procedimentos invasivos, como acesso vascular central ou intubação.[122][123]
A função imune neonatal imatura contribui para o aumento do risco de infecção fulminante. A associação da sepse com lesão na substância branca (LSB) e deficiência no neurodesenvolvimento (DND) coloca esses bebês em aumento do risco além dos seus graus de prematuridade. Antimicrobianos podem ser usados para tratar a infecção, mas a ativação contínua do sistema imunológico pode resultar em desfecho desfavorável com um aumento do risco para LSB e DND.[124]
Esse é um problema muito comum e observado em >50% dos bebês com menos de 32 semanas de idade gestacional. As causas incluem coletas de sangue iatrogênicas, vida do eritrócito mais curta (aproximadamente 50% a 60% da vida do eritrócito adulto) e produção de eritrócitos diminuída. O fornecimento de nutrição adequada e suplementação de ferro, bem como a consideração de transfusão de sangue, são, portanto, justificados.[125] Observe que os lactentes prematuros devem ser examinados quanto à disfunção tireoidiana nas primeiras 48 a 72 horas de vida, antes da transfusão de qualquer hemoderivado.[126]
O uso de eritropoetina (EPO) precoce, com menos de 8 dias de idade, em comparação com EPO tardia, entre 8 e 28 dias de idade, não demonstrou reduzir significativamente o uso ou o número de transfusões por lactente, mas demonstrou aumentar o risco de retinopatia da prematuridade e, portanto, não é recomendado.[127]
O uso de práticas transfusionais restritivas para a anemia não parece ter um impacto significativo na morte ou nas morbidades maiores na primeira alta hospitalar ou no acompanhamento.[128]
Como os bebês prematuros deixam de ter transferida uma parte importante de nutrientes e minerais durante o último trimestre, em associação com o fato de apresentarem doenças críticas e desnutrição com a nutrição parenteral total (NPT), eles têm um risco significativo de deficiência nutricional.
Administração precoce de leite materno fortificado ou o uso de uma fórmula para prematuros pode melhorar a mineralização óssea, o crescimento longitudinal e a mielinização. Os lactentes prematuros têm necessidades nutricionais diferentes se comparados com lactentes nascidos a termo e devem receber fórmulas para prematuros, se o leite materno não estiver disponível, com o objetivo de maximizar a nutrição e evitar o deficit de crescimento.[129]
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Lactentes com enterocolite necrosante grave que necessitam de ressecção intestinal parcial têm maior risco de deficit de crescimento e coléstase crônica associada à NPT prolongada. Maximização da nutrição e avaliações frequentes de ganho de peso e crescimento são, portanto, essenciais.[130]
A icterícia é quase universal em lactentes prematuros, uma vez que é causada por perdas gastrointestinais inadequadas de bilirrubina associada à progressão lenta da nutrição enteral. O tratamento da icterícia envolve a fototerapia, que é instituída quando os níveis são considerado altos, para evitar a possibilidade de kernicterus. Por causa da imaturidade do cérebro prematuro, os níveis para que ocorra kernicterus são variáveis. Por esse motivo, e pela fototerapia apresentar pouco ou nenhum efeito adverso em lactentes, uma abordagem conservadora de tratamento é realizada quando níveis recomendados são alcançados. As decisões relativas ao tratamento são orientadas pela idade gestacional, bilirrubina total sérica (BTS) específica por hora e presença de fatores de risco para neurotoxicidade por bilirrubina (idade gestacional <38 semanas, albumina <30 g/L [<3.0 g/dL], doença grave no neonato [por exemplo, sepse ou instabilidade clínica significativa nas 24 horas prévias], ou doença hemolítica isoimune, deficiência de glicose-6-fosfato ou outras doenças hemolíticas).[131]
A hemorragia intraventricular (HI) é atribuída aos vasos sanguíneos imaturos na matriz germinal e ocorre mais comumente em bebês extremamente prematuros. A mortalidade da HI grave é de 25% a 50% e para a HI leve é de 5%. As sequelas da HI incluem a lesão na substância branca, como a leucomalácia periventricular, e encefalopatia da prematuridade, com deficiência no neurodesenvolvimento subsequente nas funções motoras e cognitivas. A HI raramente ocorre após as 32 semanas de idade gestacional.[142]
A hemorragia cerebelar é uma afecção frequente, mas grave, caracterizada por sangramento no cerebelo de lactentes prematuros, geralmente antes das 28 semanas de gestação.[143] A fisiopatologia dessa afecção é complexa e muitas vezes relacionada à fragilidade dos vasos sanguíneos no cerebelo subdesenvolvido, que podem romper devido a flutuações na pressão arterial e nos níveis de oxigênio. O prognóstico para os neonatos afetados varia dependendo da extensão da hemorragia e das complicações associadas. Os casos leves podem resolver-se com efeitos mínimos em longo prazo, enquanto as hemorragias graves podem causar deficits neurológicos significativos, tais como comprometimento cognitivo e motor, paralisia cerebral ou morte.[144] O diagnóstico precoce por meio de exames de imagem e a intervenção clínica imediata são cruciais para melhorar os desfechos. O monitoramento rigoroso e o cuidado multidisciplinar são essenciais para otimizar o prognóstico.
A imaturidade gastrointestinal associada à prematuridade aumenta o risco de enterocolite necrosante (EN). O risco é inversamente proporcional à idade gestacional.
Corticosteroides pré-natal e alimentação com leite materno humano reduzem a incidência de EN.[95]
A metanálise demonstrou que os probióticos podem reduzir o risco de EN e a mortalidade em bebês <32 semanas de gestação ou com peso ao nascer <1500 g. A certeza da evidência foi avaliada de baixa a moderada, e faltam dados para bebês com <28 semanas de gestação ou peso ao nascer <1000 g.[145]
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Probióticos e simbióticos mais modernos que servem para estimular o desenvolvimento do intestino da mesma maneira que o leite materno estão atualmente sendo avaliados.[146] O tratamento com pentoxifilina direcionado à redução da resposta inflamatória associada à EN pode diminuir o tempo de internação hospitalar e a mortalidade, mas a certeza das evidências atuais é baixa.[147] A suplementação enteral de lactoferrina bovina diminui a sepse de início tardio, mas não a EN em estágio ≥2 ou a mortalidade por todas as causas sem efeitos adversos, embora esta evidência também seja de baixa certeza.[148]
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Outro ensaio constatou que a lactoferrina não reduziu a incidência de infecção, mortalidade ou outra morbidade em bebês nascidos <32 semanas.[149] Uma revisão Cochrane considerou os achados incertos.
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As sequelas em longo prazo da EN grave que requer ressecção cirúrgica incluem a síndrome do intestino curto, dependência de nutrição parenteral total e colestase crônica.
O encerramento tardio do canal arterial ocorre em 65% dos bebês extremamente prematuros e está associado ao desenvolvimento de doença pulmonar crônica. A patência do ducto que leva à necessidade aumentada de oxigênio suplementar ou suporte ventilatório pode ser tratada com indometacina ou com a ligadura cirúrgica do ducto. Uma revisão sistemática de intervenções farmacológicas constatou que altas doses de ibuprofeno oral eram mais eficazes no encerramento do canal arterial em comparação com a dose padrão de indometacina ou ibuprofeno intravenosos, sem aumento de mortalidade ou enterocolite necrosante.[150] Se a farmacoterapia falhar (após dois ciclos) ou for contraindicada, o fechamento por cateterismo ou ligadura cirúrgica pode ser considerado para lactentes com persistência do canal arterial hemodinamicamente significativa.[151]
A neovascularização proliferativa da retina em bebês extremamente prematuros é uma causa importante da cegueira em longo prazo e está associada à exposição excessiva ao oxigênio. A redução da saturação periférica de oxigênio (SpO₂) posductal para valores entre 85% e 93% até 32 semanas após a idade menstrual (idade gestacional + idade pós-parto) reduz a incidência de retinopatia da prematuridade (ROP) grave. Entretanto, a saturação <90% em bebês pré-termo está associada ao aumento de mortalidade. Uma revisão Cochrane avaliou os efeitos de saturação de oxigênio (SpO₂) direcionada a faixas de 85% a 89% (baixa) ou 91% a 95% (alta) em ensaios clínicos randomizados de bebês nascidos com menos de 28 semanas de gestação. Os resultados mostraram uma relação inversa entre mortalidade e retinopatia da prematuridade grave.[77]
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Portanto, são recomendadas tentativas para reduzir a exposição ao oxigênio ao mínimo necessário.[152]
O rastreamento oftalmológico deve ser feito para retinopatia da prematuridade em lactentes nascidos ≤30 de idade gestacional ou nascidos com ≤1500 g e lactentes nascidos >30 semanas ou com peso entre 1500 e 2000 g.[153] O momento do primeiro exame oftalmológico é recomendado entre as 4 a 9 semanas com base na idade gestacional e os exames de acompanhamento devem ser instruídos pelos achados retinianos do oftalmologista.[153]
O bloqueio do fator de crescimento endotelial vascular (VEFG) na prevenção de retinopatia da prematuridade (usando um anticorpo monoclonal direcionado para VEGF, como bevacizumabe) pode ser eficaz na Zona 1, estágio 3+ da retinopatia da prematuridade.[153] Estão sendo feitas avaliações para auferir os benefícios da administração de vitamina A (já que os lactentes prematuros têm depósitos muito baixos de vitamina A) na prevenção da ROP.
Evidências de baixa a muito baixa qualidade (em uma revisão sistemática de seis ensaios clínicos, incluindo 383 bebês com <37 semanas de gestação e com ROP do tipo 1) sugerem que em prematuros, os medicamentos anti-VEGF usados no tratamento da retinopatia da prematuridade não diminuem o descolamento da retina.[154] No entanto, um estudo multicêntrico, randomizado, aberto, de superioridade em 225 bebês com peso ao nascer menor que 1500 gramas que atenderam aos critérios de tratamento para retinopatia observou que o ranibizumabe era pelo menos tão eficaz quanto a laserterapia para sobrevida sem retinopatia ativa, sem desfechos estruturais desfavoráveis, e sem necessidade de uma modalidade de tratamento diferente às 24 semanas ou antes.[155] Os efeitos em longo prazo dos medicamentos anti-VEGF no neurodesenvolvimento estão sujeitos a investigação.[156]
As taxas de nova hospitalização de bebês prematuros após a alta são maiores que as de lactentes nascidos a termo, por causa do aumento do risco de comorbidades. Lactentes nascidos próximos ao termo têm uma probabilidade quase duas vezes maior de serem readmitidos que lactentes nascidos a termo. Eles apresentam o risco mais elevado quando não são internados ou quando permanecem por menos de 4 dias na unidade de terapia intensiva neonatal (UTIN).
Causas importantes para nova hospitalização são doenças respiratórias, baixa aceitação alimentar e desidratação, icterícia que necessita de fototerapia e infecção.[157][158][159] O risco excessivo de hospitalização em crianças prematuras diminui com a idade, mas continua elevado, em comparação com crianças nascidas a termo, até a idade de 7-10 anos.[159]
A deficiência no neurodesenvolvimento (DND) é um risco significativo e está inversamente associada à idade gestacional no parto.
A DND inclui paralisia cerebral, problemas cognitivos e motores e leve perda auditiva. No mínimo, 40% dos bebês extremamente prematuros sofrem de alguma forma de DND.[133]
Entre 10% e 20% dos bebês prematuros têm alguma forma de sequela comportamental, em comparação com <10% dos lactentes nascidos a termo. Esses transtornos são mais comuns em bebês extremamente prematuros e incluem hiperatividade e TDAH bem como problemas de conduta, emocionais e/ou com outras crianças. Outros traços comportamentais, como timidez, insegurança, adaptação social inadequada, retração social e ansiedade, também podem estar presentes.[133]
Transtorno de deficit da atenção com hiperatividade em crianças
A displasia broncopulmonar (DBP) é a complicação mais comum e mais estudada da prematuridade.[134] Ela é definida como a necessidade de oxigênio suplementar por, no mínimo, 28 dias após o nascimento.[135] A incidência é inversamente proporcional à idade gestacional. Dois terços dos bebês com doença pulmonar crônica (DPC) ou DBP são nascidos antes de completar 28 semanas gestação.
Além de problemas pulmonares agudos, as condições em longo prazo, como asma, atraso no neurodesenvolvimento e taxa de nova hospitalização durante o primeiro ano de vida são aumentadas juntamente com a DPC. A hipocapnia, resultante de volumes correntes ventilatórios excessivos, está associada ao desenvolvimento de DBP; isso destaca a importância de ventilação efetiva cuidadosa na sala de parto e posteriormente.
Intervenções direcionadas ao sucesso da extubação precoce (usando ventilação por pressão positiva nasal e pressão positiva nas vias aéreas bifásica ou contínua) e intervenções farmacológicas para reduzir a DPC (como azitromicina, montelucaste, hidrocortisona precoce, surfactante tardio e óxido nítrico, cisteína e citrulina) estão atualmente sob investigação.
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Terapia com cafeína para a apneia da prematuridade está associada a menor DBP e a melhora na sobrevivência sem deficiência no neurodesenvolvimento.[136][137] No entanto, não foi demonstrado que doses mais elevadas de cafeína melhoram a mortalidade antes da alta hospitalar ou os desfechos de desenvolvimento neurológico.[85]
Os corticosteroides sistêmicos ou inalatórios administrados a lactentes prematuros <28 semanas ao nascer, para prevenção de DBP nas primeiras 2 semanas de vida, não estão associados a nenhuma diferença significativa no desfecho composto de morte ou quadros de incapacidade neurológica nos sobreviventes.[138][139][140][141]
Bebês anteriormente extremamente prematuros têm maior probabilidade de enfrentar desafios associados com a polimedicação à medida que evoluem para a primeira infância e infância, muitas vezes devido a sua história médica complexa, permanência prolongada em unidades de terapia intensiva neonatais e exposição a intervenções.[118][161] Isso aumenta o risco de potenciais interações medicamentosas e efeitos adversos; é necessário um monitoramento vigilante.
O risco de mortalidade é inversamente relacionado à idade gestacional.[115] A sobrevivência em lactentes extremamente prematuros é de 20% a 90% e é >90% nos nascidos com mais de 28 semanas de gestação. O risco de morte é discretamente maior em bebês negros se comparados com os de outras raças.
As causas comuns de morte incluem infecção, imaturidade pulmonar intrínseca, hemorragia pulmonar ou intraventricular e enterocolite necrosante. No entanto, em alguns casos de extrema prematuridade (23 semanas de gestação ou menos), a ressuscitação não é desejada pelos pais, não é iniciada ou bem-sucedida, sendo a causa da morte relatada como "prematuridade extrema".[116]
Bebês prematuros têm um maior risco de abuso e negligência que os nascidos a termo. Avaliação do suporte familiar e transição para cuidados domiciliares são críticos para reduzir o risco de danos nessa população vulnerável.[132]
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