Etiologia

A alcalose respiratória pode se manifestar em uma variedade de cenários clínicos. A hipocapnia, como resultado da taquipneia, é a manifestação fisiológica habitual. Ela pode ocorrer como resultado de regulações inapropriadas de ventiladores ou de causas tão distintas quanto hipóxia, aumento do estímulo respiratório central e hipertermia. Pode ainda ser aplicada para tratar afecções como hipertensão intracraniana ou hipertensão arterial pulmonar neonatais.

Pulmonar

Hipoxemia é uma PaO₂ arterial baixa. A hipoxemia por si só pode produzir alcalose respiratória, e o diagnóstico diferencial é amplo. A hipoxemia pode ser diagnosticada por oximetria de pulso ou gasometria arterial. A gasometria arterial também pode identificar um distúrbio ácido-básico concomitante. Dependendo do grau e da etiologia da hipoxemia, sua correção envolve a administração de oxigênio suplementar por cânula nasal ou máscara, a aplicação de ventilação não invasiva com pressão positiva ou intubação e ventilação mecânica com pressão expiratória final positiva. Depois da correção da hipoxemia, recomenda-se uma investigação urgente para elucidar e tratar a doença subjacente.

A hipoxemia e a hipóxia tecidual afetam os quimiorreceptores periféricos localizados nos corpos carotídeos por baixa pressão arterial de oxigênio (PaO₂) e concentração elevada de H+, respectivamente, causando hiperventilação.[49] Com a hipoxemia, a intensidade da resposta depende da gravidade da hipoxemia. Quando a PaO₂ cai para menos de 70 mmHg, a frequência de disparo dos quimiorreceptores e a ventilação-minuto aumentam de maneira acelerada. A exposição a altitudes elevadas pode provocar hipoxemia, a qual pode causar alcalose respiratória por meio desse mecanismo.[50][51][52]

A alcalose respiratória no cenário de vasoconstrição induzida por hipóxia; no entanto, pode agravar a oxigenação do shunt intrapulmonar e a oxigenação sistêmica.[53] A hipocapnia também induz lesão pulmonar e potencializa a lesão pulmonar aguda após a reperfusão isquêmica.[54] O mecanismo pode estar relacionado com a permeabilidade capilar.[54] Além da hipoxemia, a estimulação dos receptores aferentes vagais nos brônquios (vias aéreas) e pulmões pode produzir taquipneia. Em pacientes com asma, os receptores de irritantes nas vias aéreas são responsáveis pela taquipneia.[55] A própria hipocapnia, por meio de um efeito irritante e lentamente adaptando os receptores de alongamento, é um estímulo adicional à broncoconstrição no estágio precoce dos ataques asmáticos.[56] Na doença pulmonar intersticial e na fibrose, há evidências de que a carga elástica aumentada e o estímulo dos mecanorreceptores da parede torácica e dos receptores intrapulmonares induzem a taquipneia.[57] Outras doenças pulmonares parenquimatosas que podem induzir a hipocapnia são edema pulmonar cardiogênico e edema pulmonar por grande altitude.[58] A alcalose respiratória na lesão pulmonar aguda pode ser um sinal precoce de síndrome do desconforto respiratório agudo em adultos, que precede infiltrados na radiografia torácica.[59][60] Aceita-se de modo geral que o pneumotórax espontâneo primário pode se manifestar com alcalose respiratória, especialmente com dor, ansiedade ou hipoxemia concomitantes.[61][62] No entanto, a hipocapnia é dependente do tamanho do pneumotórax: ocorre apenas com um grande pneumotórax >50% do volume pulmonar.[63]

É comum ocorrer alcalose respiratória na embolia pulmonar (EP) e na hipertensão arterial pulmonar.[64][65][66] Na verdade, pacientes com exacerbação da doença pulmonar obstrutiva crônica (uma população com maior risco de embolia pulmonar) e alcalose respiratória relativa podem ter embolia pulmonar concomitante.[67]

Tradicionalmente, a alcalose respiratória ou hipocapnia terapêuticas eram aplicadas para tratar temporariamente a hipertensão arterial pulmonar neonatal.[4][5] Com a disponibilidade de óxido nítrico e de outros vasodilatadores, o uso da hipocapnia terapêutica em hipertensão pulmonar neonatal deve diminuir.[1][15]

Cardiovascular

A hipoxemia e a hipóxia tecidual afetam os quimiorreceptores periféricos localizados nos corpos carotídeos por baixa PaO₂ e concentração elevada de H+, respectivamente, causando hiperventilação.[49] Com a hipoxemia, a intensidade da resposta depende da gravidade da hipoxemia. Quando a PaO₂ cai para menos de 70 mmHg, a frequência de disparo dos quimiorreceptores e, subsequentemente, a ventilação-minuto aumentam de maneira acelerada. Várias doenças, como a doença cardíaca cianótica, podem provocar hipoxemia, a qual pode causar alcalose respiratória por meio desse mecanismo. Com a hipóxia tecidual, a concentração aumentada de H+ decorrente da produção elevada de lactato age como um estímulo nos corpos carotídeos, causando hiperventilação. Esse mecanismo, por meio do qual a hipóxia tecidual induz a hiperventilação, também pode ser observado no choque cardiogênico. Trata-se do mecanismo por meio do qual a hipóxia tecidual induz a hiperventilação. A alcalose pseudorrespiratória é um tipo de hipocapnia arterial associada a uma forma atípica de acidose respiratória. Essa condição ocorre quando há uma redução crítica na perfusão pulmonar, mas a ventilação é preservada (por exemplo, na ressuscitação cardiopulmonar). Nesses casos, o sangue venoso central apresenta pressão parcial de dióxido de carbono (pCO₂) alta e potencial hidrogeniônico (pH) baixo, e o sangue arterial sistêmico apresenta pCO₂ baixa e pH normal ou alto. O diagnóstico se baseia na comparação dos gases do sangue arterial e venoso.[68]

Hematológica

A anemia grave e as hemoglobinopatias (por exemplo, talassemia e anemia falciforme) estão associadas a hipóxia tecidual, por meio da qual a produção elevada de lactato e a concentração elevada de H+ agem como um estímulo dos corpos carotídeos. Isso causa hiperventilação e alcalose respiratória.

Gastrointestinal e hepático

Sintomas gastrointestinais e hepáticos são observados na alcalose respiratória aguda (mas não na crônica). A alcalose respiratória aguda produz náuseas, vômitos e aumento da motilidade gastrointestinal. O mecanismo para o aumento do tônus cólico depende da presença de hipocapnia (e não da hiperventilação eucápnica), que parece ter um efeito direto no músculo liso do cólon. Outro mecanismo possível para gerar mudanças no tônus cólico é a modulação induzida por hipocapnia do controle neural autônomo central, embora não seja clara a influência relativa da modulação neural parassimpática e simpática.[41][42]

A taquipneia decorrente de estímulo respiratório elevado é bem conhecida em doenças hepáticas, como a cirrose, com hipertensão portopulmonar, síndrome hepatopulmonar e insuficiência hepática fulminante.[65][69][70] A alcalose respiratória crônica é a alteração ácido-básica mais prevalente em pacientes cirróticos, considerada "hiperventilação cirrótica". As causas são multifatoriais e incluem o estímulo dos centros respiratórios, hipoxemia crônica devido ao shunt arteriovenoso intrapulmonar e acidose intracelular do tronco encefálico.[71]

Iatrogênica

A hiperventilação pode ocorrer com a ventilação mecânica, incluindo a ventilação oscilatória de alta frequência.[72] A alcalose respiratória também está associada ao uso de técnicas extracorpóreas eficientes, como a derivação cardiopulmonar e a oxigenação por membrana extracorpórea.[73][74]

Infecciosa

A sepse produz hiperventilação mediada por acidose metabólica e lesão pulmonar direta. A endotoxina parece modular as fibras C aferentes vagais na produção de hiperventilação.[75] A hiperventilação secundária à hipóxia tecidual pode ser observada no choque séptico. A taquipneia com hipocapnia não é apenas comum na sepse, mas também é um critério de diagnóstico para a síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SRIS).[76]

A hipocapnia é observada em processos difusos, como meningite e encefalite.[59][77] Em pacientes com meningite, existe a hipótese de que o aumento de lactato no líquido cefalorraquidiano (LCR) cause uma diminuição do pH no LCR, provocando a estimulação dos quimiorreceptores medulares e o aumento da ventilação-minuto.[78]

Metabólica e hormonal

Os progestogênios causam alcalose respiratória, estimulando diretamente o centro respiratório, aumentando a sensibilidade dos quimiorreceptores ao dióxido de carbono e dos corpos carotídeos à hipóxia.[79][80] Evidências de hiperventilação mediada por progesterona foram demonstradas em mulheres durante o primeiro trimestre da gestação e na porção mais tardia do ciclo menstrual, e também em mulheres que tomam progestinas para reposição hormonal.[81][82][83]

A hipertermia induz a alcalose respiratória aumentando tanto a frequência respiratória quanto o volume corrente, sendo denominada de hiperpneia hipertérmica. O mecanismo exato da hiperpneia hipertérmica não é claro, mas pode incluir interações dos gases no sangue e do pH com a temperatura corporal.[84] O aumento da sensibilidade ventilatória à hipertermia não foi suprimido pela hipocapnia resultante.[85] A hiperventilação resulta no resfriamento seletivo do cérebro, um mecanismo para a redução das secreções de fluidos corporais. A hipertermia e a hipocapnia, de forma independente, também contribuem para a diminuição do fluxo sanguíneo cerebral.[85]

Neurológica

Processos difusos e focais do sistema nervoso central podem produzir alcalose respiratória. A hipocapnia é observada em processos difusos, como o traumatismo cranioencefálico. Em um grande estudo, 40% dos pacientes não intubados com lesão cerebral traumática moderada a grave apresentaram hipocapnia.[86] A hipocapnia pode ser um mecanismo protetor, particularmente na presença de hipóxia. Em um estudo de sujeitos saudáveis, a hipóxia hipocápnica efetivamente preservou a autorreguladora do cérebro.[87] De maneira paradoxal, um estudo adicional mostrou que bebês com encefalopatia hipóxico-isquêmica expostos à hipocarbia precoce apresentaram aumento do risco de óbito ou de deficiência do neurodesenvolvimento.[88] Além disso, um estudo retrospectivo realizado em adultos intubados com lesão cerebral traumática em um centro de trauma revelou que a hiperventilação espontânea é um fator independente associado a um desfecho neurológico funcional ruim.[89]

A alcalose respiratória pode ter um papel na convulsão febril em crianças. Um estudo prospectivo demonstrou que crianças que apresentam convulsão febril tiveram a hipocapnia medida a partir de sangue venoso (média PCO₂ 23 mmHg, pH 7.43) antes das convulsões, com PCO₂ mais alta (média 29 mmHg, pH 7.41) obtida 2 horas após as convulsões. Os pesquisadores sugeriram que a hipocapnia induzida por febre é um dos fatores desencadeantes que induzem à convulsão.[90]

Os processos focais, como massa cerebral ou acidente vascular cerebral (AVC), também podem causar alcalose respiratória. Uma revisão de 21 relatos de casos demonstrou alcalose respiratória em pacientes com astrocitoma, linfoma, metástase de carcinoma da laringe, meduloblastoma e glioma pontino, todos envolvendo o tronco encefálico.[91]

Em um pequeno estudo de pacientes com AVC isquêmico envolvendo o tronco encefálico, a taquipneia ou a respiração de Cheyne-Stokes foram observadas em uma maioria de pacientes e estavam geralmente associadas à alcalose respiratória.[92] Em outro estudo de 27 pacientes com AVCs (24 isquêmicos e 3 hemorrágicos) não envolvendo o tronco encefálico, 40% apresentaram alcalose respiratória.[93] Os 3 pacientes com AVC hemorrágico no estudo não apresentaram alcalose respiratória, apesar de ter sido relatada hiperventilação neurogênica central.[94] A alcalose respiratória aguda também foi relatada como uma complicação da terceiro ventriculostomia endoscópica em um paciente com hidrocefalia obstrutiva.[95]

A alcalose respiratória também pode ser observada na apneia central do sono (ACS) não hipercápnica, a forma mais comum de ACS.[96] Nesse distúrbio, as oscilações no estímulo respiratório estão associadas à hiperventilação e à hipocapnia, e são caracterizadas pela intensificação da resposta ventilatória à hipercapnia.[97][98] A associação da hipocapnia diurna com ACS não hipercápnica sugere que a hipocapnia crônica pode ter uma função no mecanismo desse distúrbio.[98][99] A hipocapnia noturna, portanto, pode ser resultante da ACS, enquanto a hipocapnia diurna sugere que um paciente apresenta risco elevado para ACS. Além disso, um estudo mostrou que a hipopneia central induzida por hipocapnia (uma redução no fluxo de 30% ou mais em relação ao controle sem esforço inspiratório) produz um estreitamento da faringe na fase expiratória, que pode ser responsável pela patogênese da obstrução das vias aéreas superiores durante o sono.[99]

Tradicionalmente, a alcalose respiratória ou hipocapnia terapêuticas têm sido aplicadas para tratar temporariamente a hipertensão intracraniana.[4] Em pacientes com hipertensão intracraniana, a hipocapnia terapêutica diminui o tempo de permanência na unidade de terapia intensiva (UTI).[14] No entanto, a hipocapnia excessiva induz a vasoconstrição cerebral e pode exacerbar a isquemia cerebral. De fato, as diretrizes atuais para o manejo da lesão cerebral traumática não recomendam a hiperventilação profilática prolongada com pressão parcial de dióxido de carbono no sangue arterial (PaCO₂) menor ou igual a 25 mmHg.[100] O benefício da hipocapnia terapêutica ainda não foi comprovado, e ela deve ser limitada a casos de hipertensão intracraniana que oferecem risco de vida.[12][13]

Farmacológica

Medicamentos conhecidos por induzir alcalose respiratória por meio de hiperventilação incluem salicilatos (em superdosagem), nicotina, derivados da xantina (por exemplo, teofilina), catecolaminas (por exemplo, agonistas beta-2, como terbutalina ou salmeterol, noradrenalina), analépticos (por exemplo, nicetamida, doxapram) e hormônios progestacionais (por exemplo, medroxiprogesterona).[101][102] Há relatos de que o levofloxacino causa encefalopatia aguda acompanhada de alcalose respiratória grave.[103]

Psiquiátrico

A síndrome de hiperventilação é uma entidade clínica relatada predominantemente em mulheres na terceira ou quarta década de vida, consistindo de hiperventilação associada a transtorno psiquiátrico, especialmente ansiedade e pânico.[104] Os pacientes apresentam dispneia episódica com ventilação alveolar inadequadamente alta.[105] O transtorno de ansiedade generalizada pode mimetizar muitos sintomas da alcalose respiratória (por exemplo, tontura, esquecimento, enfermidades somáticas). Esses sintomas são desencadeados pela pressão parcial de dióxido de carbono no sangue arterial (PaCO₂) <20 mmHg.[43] O componente de ansiedade pode estar ausente e pode ser difícil distinguir se a ansiedade é o fator desencadeante ou o resultado da hiperventilação. A etiologia da síndrome de hiperventilação não é clara e o diagnóstico é obtido por exclusão.

O diagnóstico pode ser feito pelo teste de provocação de hiperventilação. O teste é positivo se, durante a hiperventilação voluntária, o paciente apresentar sintomas similares aos que ocorrem durante os ataques. No entanto, observou-se que este teste tem alta taxa de falso-positivos, e sua validade tem sido questionada.[104]

O teste ergométrico foi proposto como ferramenta diagnóstica com um estudo que observou que os pacientes com síndrome de hiperventilação tiveram um CO₂ ao final da expiração (PETCO₂) relativamente inalterado, e razão VE/VCO₂ (ventilação-minuto, produção de dióxido de carbono por unidade) no pico do esforço comparada ao repouso, enquanto os sujeitos do grupo de controle apresentaram aumento de PETCO₂ e redução de VE/VCO₂.[105] Foi demonstrado que essa falta de alteração na PETCO₂ e VE/VCO₂ no pico do esforço tem uma especificidade de 93% e 83%, respectivamente.

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