Abordagem
Para a maioria dos pacientes com polineuropatia simétrica distal, os sintomas sensoriais ocultam os sintomas motores.
Os testes iniciais que devem ser solicitados incluem o hemograma completo; velocidade de hemossedimentação (VHS), nível glicêmico em jejum e painel de colesterol; hormônio estimulante da tireoide (TSH); níveis de vitamina B12 com metabólitos; sorologia para hepatite, HIV, doença de Lyme e sífilis; fator antinuclear; e eletroforese de proteínas séricas com imunofixação.
Um exame eletrodiagnóstico deve ser considerado na investigação inicial, particularmente se a etiologia for desconhecida.
Considerações sobre a história do paciente
Dormência, coordenação prejudicada e problemas de equilíbrio refletem doenças que afetam as fibras nervosas sensoriais. O equilíbrio é pior nas situações em que a visão é prejudicada, como ao usar xampu no cabelo durante o banho ou nos ambientes com pouca luz.
As disestesias podem incluir parestesia, queimação, dor, edema, rigidez, formigamento e choques elétricos nas extremidades distais dos membros inferiores. Estes sintomas apresentam-se comumente de forma simétrica nos pés ou pododáctilos. Com o tempo, os sintomas sensoriais ascendem em direção proximal nas pernas. Se os sintomas se estenderem até o nível do joelho, o paciente poderá relatar formigamento ou dormência nas pontas dos dedos.
Os sintomas motores incluem fraqueza, que geralmente é distal. Em polineuropatias graves, o paciente pode desenvolver pé caído bilateralmente.
Tontura em posição ortostática, disfunção erétil, hesitação urinária, constipação ou diarreia, saciedade precoce e distúrbios da sudorese sugerem uma neuropatia autonômica.
A história médica pregressa requer uma revisão cuidadosa porque as polineuropatias são manifestações comuns de doenças sistêmicas. Pode-se presumir que a polineuropatia dos pacientes com doenças sistêmicas subjacentes, como diabetes, insuficiência renal e amiloidose, seja causada pela doença subjacente, sendo geralmente uma manifestação tardia. Pode ser razoável realizar uma breve investigação de outras neuropatias tratáveis, que possam apresentar comorbidade.[42]
Uma história familiar de pés com arco alto ou dedos dos pés em martelo aumenta a possibilidade de neuropatia de Charcot-Marie-Tooth.
Perguntar ao paciente sobre sua ocupação e seus hobbies pode revelar uma exposição a neurotoxinas conhecidas.
Os medicamentos e suplementos precisam ser cuidadosamente revistos porque muitos medicamentos farmacêuticos (principalmente os agentes quimioterápicos) podem causar uma polineuropatia.
A maioria das polineuropatias se desenvolve cronicamente. As polineuropatias rapidamente progressivas apresentam uma lista muito menor de possibilidades diagnósticas. As polineuropatias que evoluem em horas a dias incluem as neuropatias induzidas por toxinas (por exemplo, difteria, arsênico), a síndrome de Guillain-Barré (SGB) e a neuropatia porfírica. As neuropatias imunologicamente mediadas, as neuropatias paraneoplásicas e as neuropatias nutricionais e tóxicas podem se apresentar de forma subaguda (de semanas a meses).
Exame físico
Achados físicos gerais:
A presença de eritema em áreas expostas ao sol sugere lúpus eritematoso sistêmico (LES)
Erupções cutâneas e úlceras purpúricas sugerem uma neuropatia vasculítica
Linhas brancas transversais (faixas de Mee) nas unhas podem ocorrer com envenenamento por arsênico ou tálio
Pés cavos e pododáctilos em martelo podem ser observados em associação com a neuropatia de Charcot-Marie-Tooth. Considere examinar os pés de familiares do paciente, caso também estejam presentes à consulta.
A atrofia da musculatura distal, particularmente da panturrilha e da canela, que causa uma aparência de "cegonha" ou "garrafa de champanhe", pode ser observada na neuropatia de Charcot-Marie-Tooth.
Achados em exames neurológicos:
Atrofia da musculatura intrínseca do pé e fraqueza distal.
A diminuição da sensibilidade térmica e dolorosa distal sugere perda de fibras nervosas sensoriais de pequeno diâmetro.
A diminuição da sensibilidade vibratória e proprioceptiva distal sugere perda de fibras sensoriais de grande diâmetro.
Reflexos distais simetricamente reduzidos ou ausentes. Reflexos assimétricos devem levantar suspeitas de radiculopatia ou neuropatia multifocal (por exemplo, neuropatia vasculítica). Reflexos exacerbados podem sugerir uma mielopatia. Os pacientes assintomáticos com idade mais avançada podem ter reflexos aquileus ausentes e limiares sensoriais aumentados para o calor, a vibração e o frio.
As alterações tróficas da pele incluem pele ressecada e rachada, suor aumentado ou reduzido, queda de cabelo, rubor, formação de calos e ulceração, especialmente em um contexto de sensibilidade prejudicada.[43] O uso de absorventes para detecção de suor não é recomendado.[44]
Um teste de monofilamentos de Semmes-Weinstein anormal em 5.07/10g pode aumentar a suspeita de neuropatia de fibras largas nos pacientes diabéticos, mas não deve ser usado como único método diagnóstico.[45]
Exames laboratoriais
A história, o exame físico e o exame eletrodiagnóstico devem direcionar o exame laboratorial. Infelizmente, é comum o médico deparar-se com uma polineuropatia sensório-motora distal genérica e uma história clínica não reveladora. Há diferentes abordagens para o algoritmo de testagem nessa situação.[22][46][47][48][49]
Exames iniciais:
Hemograma completo, VHS, TSH.
Nível de glicemia em jejum e painel do colesterol.
Níveis de vitamina B12 com metabólitos.
Eletroforese de proteínas séricas com imunofixação, se houver suspeita de gamopatia monoclonal.
Sorologias para hepatite B e C, vírus da imunodeficiência humana (HIV) e sífilis.
Fatores antinucleares (incluindo SS-A e SS-B), fatores nucleares extraíveis.
Estudos da condução nervosa e eletromiografia com agulha.
Exames subsequentes:
Se o nível de glicose em jejum for normal, considere um teste oral de tolerância à glicose de 2 horas. A intolerância à glicose foi implicada como uma causa de polineuropatias distais.[13][14]
Quando o nível de B12 é baixo ou se encontra próximo ao limítrofe inferior, o nível de ácido metilmalônico deve ser verificado. Uma elevação do nível de ácido metilmalônico sugere comprometimento das vias metabólicas dependentes da vitamina B12. A sensibilidade do teste do ácido metilmalônico é maior em conjunto com uma homocisteína elevada.[29]
Em casos de má absorção gastrointestinal, os níveis de vitamina E e cobre podem ser úteis.
A medição de piridoxal fosfato sérico é usada para se avaliar uma deficiência ou toxicidade por vitamina B6.
Em pacientes com história de exposição, é aconselhável verificar os níveis de metais pesados.
Já existe testagem comercialmente disponível para algumas neuropatias genéticas (neuropatia de Charcot-Marie-Tooth). O rendimento diagnóstico é maior para as polineuropatias genéticas desmielinizantes que para as axonais.
Uma análise do líquido cefalorraquidiano (LCR) pode ser útil na avaliação de suspeita de neuropatias inflamatórias e/ou rapidamente progressivas. Na síndrome de Guillain-Barré (SGB) e na polirradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória crônica, o LCR geralmente é acelular com níveis proteicos elevados (dissociação albuminocitológica).
Ácidos graxos de cadeia muito longa (na suspeita de adrenomieloneuropatia) e lactato e piruvato séricos (na suspeita de neuropatia mitocondrial).
Anticorpos séricos para antígenos antineurais e antigangliosídeos podem ser encontrados em neuropatias paraneoplásicas e outras neuropatias mediadas imunologicamente. Os testes comercialmente disponíveis incluem os anticorpos anti-Hu (ANNA-1), anti-Ri (ANNA-2), anti-CV2/CRMP5 e anti-Yo (PCA-1) para investigar neuropatias paraneoplásicas. Testes para os anticorpos anti-MAG/SGPG, sulfatide, GM-1, GD1b e GQ1b podem ajudar na investigação de outras neuropatias mediadas imunologicamente. Os testes para esses anticorpos são geralmente reservados para polineuropatias graves ou rapidamente progressivas não explicadas.
Anticorpos anti-Ro (SS-A) e anticorpos anti-La (SS-B) quando houver suspeita de síndrome de Sjögren (olhos secos, xerostomia, queilite angular) ou LES (artrite, erupção cutânea em forma de borboleta, hepatomegalia, esplenomegalia).
Eletroforese de proteínas urinárias com imunofixação pode ser considerada em associação com a eletroforese de proteínas séricas na investigação de uma gamopatia monoclonal.[50]
Testes autonômicos podem ser usados para diagnosticar neuropatia autonômica. As funções cardiovagal, adrenérgica e sudomotora pós-gangliônicas podem ser avaliadas.[51]
Teste eletrodiagnóstico
Os estudos da condução nervosa e a eletromiografia ajudam a confirmar o diagnóstico clínico e a determinar se a neuropatia é primariamente axonal ou desmielinizante. Eles fornecem informações importantes, como o grau de desmielinização presente, o padrão de envolvimento neuronal e a cronicidade e a gravidade da neuropatia. Esses exames devem ser considerados na investigação diagnóstica inicial, particularmente quando a causa da neuropatia for desconhecida.
Se o estudo eletrodiagnóstico revelar uma polineuropatia desmielinizante, etiologias específicas deverão ser consideradas. Essas etiologias incluem a SGB, a polirradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória crônica (PDIC), as gamopatias monoclonais e determinadas neuropatias hereditárias.
Pele e nervos
A biópsia de pele tem sido cada vez mais usada para auxiliar no diagnóstico de polineuropatia, particularmente da polineuropatia de fibras finas (ou seja, confirmar a densidade reduzida das fibras sensoriais intraepidérmicas), pois a morbidade é menor em relação à biópsia de nervo. Ela é particularmente útil no cenário de sintomas convincentes e testes eletrodiagnósticos normais, o que é típico da doença de fibras finas isolada.[8] A biópsia de pele também pode ajudar a distinguir entre neuropatias comprimento-dependentes e multifocais.
As biópsias de nervos geralmente são reservadas para polineuropatias assimétricas rapidamente progressivas. Vasculite, sarcoidose, neuropatia axonal gigante, hanseníase, doença de Tangier, infiltração tumoral e amiloidose podem ser diagnosticadas por biópsia de nervo. Ela pode ser útil em polirradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória crônica (PDIC) atípica. Um nervo sensorial (geralmente o nervo sural) é submetido a biópsia para se evitar morbidade desnecessária. A biópsia concomitante de nervo e músculo pode ser benéfica em cenários selecionados.[52] A biópsia de nervo tem um rendimento diagnóstico muito baixo na polineuropatia simétrica distal típica e, geralmente, não é indicada na avaliação desses casos.
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