Etiologia
Existem muitas causas de polineuropatia, incluindo síndromes neurológicas, doenças sistêmicas, deficiências nutricionais, toxinas/medicamentos e distúrbios genéticos. Adicionalmente, muitas outras afecções neurológicas podem mimetizar os sinais e sintomas de polineuropatia.
Doenças sistêmicas
Neuropatia endócrina
A polineuropatia diabética se desenvolve em cerca de 50% dos pacientes diabéticos, e é a causa mais comum de polineuropatia no mundo.[5] Os fatores de risco incluem tabagismo, hipertensão, idade avançada, diabetes de duração prolongada e maior grau de hiperglicemia.
A intolerância à glicose sem diabetes, também chamada de pré-diabetes, com nível de glicose sérica de 7.8 a 11.0 mmol/L (140 a 199 mg/dL) 2 horas após uma carga de glicose oral de 75 g, também pode estar associada com uma polineuropatia.[13][14]
Hipotireoidismo e acromegalia podem estar associados a polineuropatias motoras e sensoriais.
Neuropatia infecciosa
A polineuropatia pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) pode ser causada pela infecção ou por antirretrovirais dideoxinucleosídeos. Baixas contagens de linfócitos CD4 e cargas virais altas podem aumentar o risco.[15][16]
A infecção viral por hepatite C, a difteria e a hanseníase podem causar polineuropatia. A doença de Lyme pode causar uma variedade de distúrbios dos nervos periféricos; a neuropatia axonal pode ser uma manifestação da doença de Lyme neurológica em estágio avançado.[17][18][19] A difteria é conhecida por causar uma doença desmielinizante aguda pós-infecciosa ao interferir na síntese de mielina; a toxina da difteria também é usada para desmielinizar nervos no contexto da pesquisa laboratorial.[20]
Mediado imunologicamente
A síndrome de Guillain-Barré (SGB) se refere a uma polineuropatia rapidamente progressiva, com frequência predominantemente motora. Ela geralmente ocorre de 1 a 3 semanas após uma doença respiratória ou gastrointestinal. Há variantes desmielinizantes e, menos comumente, axonais. A SGB pode mimetizar outros distúrbios e se apresentar de maneira atípica.[21] Uma variante, a síndrome de Miller Fisher, apresenta arreflexia, oftalmoplegia e ataxia; pode ser precedida por infecção por Campylobacter jejuni ou Haemophilus influenzae, e os pacientes podem ter anticorpos IgG anti-GQ1b.[22]
A polirradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória crônica (PDIC) é uma neuropatia mediada imunologicamente na qual a fraqueza costuma ser o sintoma proeminente de apresentação. Ela se desenvolve de maneira subaguda ao longo de semanas a meses. Por convenção, os sintomas devem ter evoluído ou recidido por mais de oito semanas.[23] A PDIC pode ocorrer concomitantemente com outras doenças clínicas, como as gamopatias monoclonais, infecção por HIV, diabetes mellitus, desmielinização do sistema nervoso central (SNC) ou doença inflamatória intestinal.
As doenças do tecido conjuntivo, como a síndrome de Sjögren e o lúpus eritematoso sistêmico (LES), estão associadas à polineuropatia, que pode ser o sintoma de apresentação inicial.
A doença celíaca e a sensibilidade ao glúten estão associadas predominantemente com uma neuropatia periférica axonal motora e sensorial.[24][25]
Gamopatia monoclonal
Uma minoria de pacientes com gamopatias monoclonais (como mieloma múltiplo, gamopatia monoclonal de significado indeterminado, doença das cadeias pesadas, plasmacitoma e macroglobulinemia de Waldenström) desenvolve uma polineuropatia sensório-motora simétrica. Geralmente, os pacientes com gamopatias de imunoglobulina M (IgM) apresentam maior ataxia sensorial e desmielinização do sistema nervoso que os pacientes com gamopatias de imunoglobulina A (IgA) e de imunoglobulina G (IgG). Aproximadamente 50% dos pacientes com gamopatia de IgM apresentam anticorpos anti-MAG/SGPG, que estão estritamente associados a polineuropatia desmielinizante.[26]
A amiloidose familiar e a amiloidose primária estão associadas a polineuropatias sensório-motoras distais de lenta progressão.[27] Com frequência, as fibras autonômicas e sensoriais de pequeno diâmetro são particularmente afetadas.
Polineuropatia do paciente crítico
Os pacientes com sepse e falência múltipla de órgãos podem desenvolver uma polineuropatia rapidamente progressiva. Frequentemente, a primeira suspeita de polineuropatia do paciente crítico é quando há dificuldade para se fazer o desmame do paciente do suporte ventilatório. A miopatia do paciente crítico também pode estar presente.
Insuficiência renal
A polineuropatia urêmica geralmente só é observada em pacientes com níveis séricos de creatinina de 442 micromoles/L (5 mg/dL) ou superiores. Geralmente, a polineuropatia é de progressão lenta, embora já tenham sido descritas polineuropatias urêmicas rapidamente progressivas.
Paraneoplásica
Uma polineuropatia sensório-motora mais comumente associada ao câncer de pulmão de pequenas células (incluindo anticorpos anti-Hu [ANNA-1] associados ao câncer pulmonar de pequenas células).[28] Ela também pode estar associada a linfomas e outras neoplasias hematológicas, além de cânceres de ovário, cervical e de mama.
Deficiências nutricionais
Deficiência de tiamina
A polineuropatia é frequentemente associada a intensas disestesias em queimação. A progressão geralmente é subaguda ou crônica. No entanto, nos casos graves, os sintomas podem evoluir em alguns dias. Os transtornos decorrentes do uso de bebidas alcoólicas e cirurgia bariátrica prévia são fatores de risco.
Deficiência de piridoxina (vitamina B6)
Ocorre com determinados medicamentos (isoniazida e hidralazina), diálise peritoneal crônica ou transtornos decorrentes do uso de bebidas alcoólicas; as manifestações incluem polineuropatia.
A toxicidade pode se desenvolver se houver reposição iatrogênica em excesso ou suplementação de venda livre.
Deficiência de vitamina B12
Geralmente, a polineuropatia está associada a uma mielopatia, cuja forma mais grave é a degeneração combinada subaguda da medula espinhal. Os pacientes podem se apresentar com sintomas nos membros superiores.
Os fatores de risco incluem doença gastrointestinal crônica e cirurgia gastrointestinal, ambas associadas com má absorção; idade avançada; gestação; adesão a uma dieta vegana; uso em longo prazo de determinados medicamentos, como metformina, inibidores da bomba de prótons e anticonvulsivantes.[29][30][31][32][33]
A anemia perniciosa é um distúrbio autoimune que afeta a mucosa gástrica com absorção prejudicada de cobalamina alimentar (vitamina B12), resultando em deficiência de vitamina B12.[34]
Outras deficiências nutricionais
A deficiência de vitamina E e de cobre foi associada a polineuropatias.
Induzida por toxinas ou medicamentos
A polineuropatia relacionada ao etanol associada a transtornos decorrentes do uso de bebidas alcoólicas pode ser causada pela toxicidade direta do etanol sobre o nervo e/ou por deficiências nutricionais concomitantes.
Fármacos podem causar polineuropatias. Agentes quimioterápicos usados para tratar neoplasias malignas, especialmente os alcaloides da vinca, análogos da platina e taxois, são comumente responsáveis. Os outros agentes farmacêuticos implicados incluem antibióticos como a dapsona, a isoniazida, a nitrofurantoína e as fluoroquinolonas.[35][36] A amiodarona, a colchicina, a fenitoína, os medicamentos estatinas e a talidomida também podem causar polineuropatia.
Os metais pesados que podem causar polineuropatia incluem o arsênico, o chumbo, o tálio e o mercúrio. As outras toxinas incluem a acrilamida, o dissulfeto de carbono, a metilbutilcetona e o fosfato de triortocresila.
Genética
A neuropatia de Charcot-Marie-Tooth refere-se a um extenso grupo heterogêneo de polineuropatias hereditárias. A herança pode ser autossômica dominante, autossômica recessiva ou ligada ao cromossomo X. Existem formas axonais e desmielinizantes.
A amiloidose hereditária com mutações da transtirretina (hATTR) afeta os nervos periféricos, o coração e os rins. O reconhecimento precoce é importante devido à crescente disponibilidade de opções de tratamento.[37][38]
A adrenomieloneuropatia, a doença de Fabry, a doença de Refsum e a doença de Tangier também podem estar associadas a polineuropatias.
A porfiria aguda intermitente causa uma neuropatia periférica predominantemente motora com comprometimento marcado dos membros superiores.
Idiopática
Uma polineuropatia idiopática (ou criptogênica) é um diagnóstico de exclusão. Apesar de amplas investigações, 20% a 50% dos pacientes que se apresentam com polineuropatias em centros acadêmicos recaem nessa categoria.[12][39][40] Os pacientes geralmente têm mais de 40 anos de idade, e a polineuropatia tende a evoluir muito lentamente.
Mimetizações neurológicas
As doenças neurológicas que podem mimetizar os sinais e sintomas de polineuropatia incluem a síndrome da cauda equina, a mononeurite multiplex, radiculopatias lombossacrais múltiplas ou plexopatias lombossacrais.
A cauda equina pode ocorrer como resultado de trauma na medula espinhal, fratura por compressão vertebral, hérnia de disco, estenose da coluna vertebral, tumor primário ou metastático da medula espinhal ou infecção. A lesão na raiz nervosa pode ser aguda, subaguda ou crônica e, geralmente, ocorre em decorrência de compressão direta, infiltração ou comprometimento do suprimento vascular.
A mononeurite múltipla é uma neuropatia multifocal com um quadro clínico distinto de deficits motores e sensoriais progressivos na distribuição de nervos periféricos específicos. Em geral, ela resulta de vasculite, que pode ser sistêmica ou isolada nos nervos. Menos comumente, ela resulta de reações de hipersensibilidade a medicamentos ou infecções, sarcoidose, infiltração direta por tumor, ou pode ser consequência de infecção bacteriana ou viral direta dos nervos.
As radiculopatias podem causar deficits sensoriomotores e sinais do neurônio motor inferior em padrão dermatomal/miotomal, geralmente em decorrência de doença degenerativa discal ou de osteófitos vertebrais. Quando ocorrem em vários níveis espinhais bilaterais e adjacentes, os deficits dermatomais/miotomiais parecem ser confluentes e podem mimetizar a polineuropatia.
As plexopatias (ou seja, lesões do plexo lombossacral) têm apresentação similar às radiculopatias unilaterais adjacentes. Mais raramente, elas podem ocorrer bilateralmente. As etiologias observáveis incluem a amiotrofia neurálgica diabética e compressão/invasão por tumor, sarcoidose, abscesso/infecção ou hematoma no espaço retroperitoneal.
O uso deste conteúdo está sujeito ao nosso aviso legal