Etiologia

A hipernatremia, definida como uma concentração plasmática de sódio >145 mmol/L (145 mEq/L), resulta, na maioria dos casos, da perda de água.[6][9]​​​ No entanto, há outras causas que também devem ser consideradas, como deficit de ingestão de água livre, ganho de sódio e excesso de mineralocorticoides. A pseudo-hipernatremia é uma possibilidade em pacientes com hipoalbuminemia.[10][11]

Perda de água livre

Perdas renais

É considerada a causa mais comum de hipernatremia; ocorre tanto através da diurese osmótica quanto como consequência de diabetes insípido.[6]

  • Decorrentes de diurese osmótica

    • Tipicamente, o paciente se apresentará em estado hipovolêmico.

    • As causas mais comuns de diurese osmótica são a hiperglicemia e a glicosúria no diabetes mellitus mal controlado. O estado hiperosmolar hiperglicêmico (EHH) geralmente ocorre em pacientes mais velhos com diabetes mellitus do tipo 2 e tem uma taxa de mortalidade entre 5% e 16%.[12]​​ O estado patológico inclui hiperglicemia, desidratação e hiperosmolaridade sem cetoacidose.

    • Diuréticos de alça, como furosemida e torasemida, podem causar perdas renais de sódio; eles produzem uma diurese isosmótica que resulta na capacidade concentradora renal prejudicada, o que reduz a reabsorção de água.

    • O aumento da produção de ureia (por exemplo, como resultado de uma dieta com alto teor proteico) e o manitol intravenoso também podem resultar em diurese osmótica.[6]

    • Obstruções do débito urinário (por exemplo, em função de hipertrofia prostática benigna, prostatite, câncer de próstata, nefrolitíase, tumores vesicais, estenoses da uretra) resultam, frequentemente, em diurese pós-obstrutiva após serem corrigidas. Consequentemente, há perda de água livre, que pode resultar em hipernatremia.

  • Decorrentes de diabetes insípido

    • Tipicamente, o paciente se apresentará em estado euvolêmico.

    • A hipernatremia secundária à perda renal não osmótica de água geralmente é causada por diabetes insípido central, caracterizado por reduzida secreção de vasopressina, ou por diabetes insípido nefrogênico, resultante da resistência às ações da vasopressina.[13]

    • O diabetes insípido central é mais comumente causado pela destruição da neuro-hipófise decorrente de trauma, neurocirurgia, neoplasia, acidentes vasculares, doenças granulomatosas ou infecção.[14]​ Já foram relatados casos idiopáticos, bem como casos hereditários nos quais a forma genética da doença é herdada de modo autossômico dominante, tendo sido atribuída a mutações no gene da pró-pressofisina (precursor da arginina-vasopressina [AVP]). Agentes ingeridos que reduzem a secreção central de hormônio antidiurético (HAD) incluem fenitoína e etanol.[15]​​

    • O diabetes insípido nefrogênico pode ser hereditário ou adquirido.[14]

    • O diabetes insípido nefrogênico congênito é um caráter recessivo ligado ao cromossomo X decorrente de mutações no gene do receptor V2. O diabetes insípido nefrogênico também pode ser causado por mutações no gene da aquaporina-2 que codifica as proteínas de canais de água cuja inserção na membrana é estimulada pela AVP.

    • São inúmeras as causas esporádicas de diabetes insípido nefrogênico, incluindo lítio, hipercalcemia, hipocalemia e condições que prejudicam a hipertonicidade medular, como a necrose papilar.

    • Gestantes, no segundo ou terceiro trimestre, podem desenvolver diabetes insípido nefrogênico como resultado da secreção excessiva de vasopressinase pela placenta.[14]

    • Outras doenças renais que podem resultar em diabetes insípido nefrogênico adquirido incluem doença falciforme, uropatia obstrutiva e nefropatia de refluxo.[14] Agentes ingeridos que podem induzir ao diabetes insípido nefrogênico e causar hipernatremia incluem colchicina, gentamicina, lítio, rifampicina e propoxifeno (dextropropoxifeno).[15]

Perdas não renais

Podem ser devidas a perdas insensíveis de água, como evaporação pela pele. Em casos de queimaduras graves, os pacientes geralmente estão euvolêmicos nas primeiras 48 horas e, depois disso, se tornam hipovolêmicos. Perdas insensíveis de água também podem ocorrer como resultado de perdas pelo trato gastrointestinal. Esses pacientes geralmente se apresentam em estado hipovolêmico.[1]

  • As perdas insensíveis aumentam com febre, exercícios, exposição ao calor e queimaduras graves. Queimaduras graves, geralmente de origem térmica, causam aumento da permeabilidade capilar e perda de fluidos para o terceiro espaço nas primeiras 24 horas após a queimadura (paciente euvolêmico). Após esse período, o dano cutâneo permite maior evaporação, aumentando as perdas insensíveis de água (o paciente fica hipovolêmico). Quanto ao calor e à sudorese, a concentração de sódio no suor diminui com a perspiração profusa e contínua, aumentando, assim, a perda de água sem soluto.

  • A diarreia grave é a causa gastrointestinal mais comum de hipernatremia, e o paciente geralmente se apresenta em estado hipovolêmico. A diarreia osmótica induzida por ingestão de lactulose ou sorbitol, a má absorção de carboidratos (mais comumente resultado de um espru tropical, ressecção intestinal, intolerância à lactose ou pancreatite) e gastroenterites virais resultam em perda de água maior que as perdas de sódio e potássio. Isso contrasta com a diarreia secretória, que tem osmolalidade fecal similar ao plasma e se apresenta como contração de volume com concentração plasmática de sódio normal ou baixa.[6]

  • Um paciente com vômitos prolongados, independentemente da causa, pode perder mais água que sódio, levando à depleção de volume e à hipernatremia.

  • Fístulas entéricas (fístulas são tratos que ligam 2 órgãos revestidos por epitélio) também podem resultar em perdas gastrointestinais insensíveis; elas podem ocorrer como uma complicação da doença de Crohn.

Deficit de ingestão de água livre

Costuma resultar do acesso limitado à água ou de falha no mecanismo de sede. O paciente se apresentará em estado hipovolêmico.

  • Aqueles que podem ter acesso limitado à água incluem lactentes, pessoas com deficiência, pessoas com comprometimento do estado mental, pacientes em pós-operatório, pacientes em instituição asilar e pacientes intubados.

  • Falhas no mecanismo de sede resultantes de hipodipsia primária são raras e causadas por danos dos osmorreceptores hipotalâmicos que controlam a sede. Isso pode ser devido a uma variedade de mudanças patológicas, incluindo oclusão vascular, tumores, lesões hipotalâmicas congênitas e doença granulomatosa (por exemplo, sarcoidose).[6]

  • A amamentação inadequada sem suplementação pode causar hipernatremia grave com potencial risco de vida ao lactente.[16]

Ganho de sódio

A hipernatremia decorrente do ganho de sódio é incomum. A sobrecarga exógena de sódio é, frequentemente, associada à hipernatremia acentuada (concentração plasmática de sódio >170 mmol/L [170 mEq/L]).[17]​ O paciente geralmente se apresenta em estado hipervolêmico.[6]​ As causas incluem:

  • Administração inadvertida de cloreto de sódio hipertônico (por exemplo, irrigação de cistos hidáticos) ou de bicarbonato de sódio (por exemplo, acidose metabólica grave)[18]

  • Administração de cloreto de sódio isotônico (solução salina) para um paciente com cetoacidose diabética (CAD) e diurese osmótica

  • Substituição do açúcar por sal na fórmula infantil (acidental ou intencional)​[17]

  • Ingestão maciça de sal (por exemplo, usar sais de Epsom como agente emético ou para gargarejo).

Excesso de mineralocorticoides

Esses pacientes podem se apresentar em estado hipervolêmico.

  • A síndrome de Cushing, seja por etiologia primária ou secundária, produz um aumento acentuado de cortisol, aumentando, assim, a glicose sérica, o que muitas vezes causa o diabetes ou à hipernatremia não controlados (em função da retenção de sódio decorrente da retenção de água).

  • O aldosteronismo primário, que produz hiperaldosteronismo, causa aumento da reabsorção de sódio, resultando em expansão volumétrica. A leve e persistente expansão volumétrica reconfigura o osmostato regulador da liberação de hormônio antidiurético (HAD) e da sede, aumentando-o em vários milimoles por litro (mEq/L). Como resultado, a concentração plasmática de sódio de pacientes com aldosteronismo primário costuma ser estável entre 143 mmol/L (143 mEq/L) e 147 mmol/L (147 mEq/L) (hipernatremia leve).[19]

O uso deste conteúdo está sujeito ao nosso aviso legal