Abordagem

Uma anamnese focada é um fator crítico para estabelecer o diagnóstico e também para diferenciar entre a dismenorreia primária e a secundária. Um exame clínico detalhado é muito valioso no auxílio do diagnóstico da causa da dismenorreia secundária.

Existem muitos mitos associados aos distúrbios menstruais e o médico deve adotar uma abordagem cuidadosa e fornecer uma explicação quanto à sua etiologia e manejo.[38][39] Muitas vezes, o tratamento é introduzido antes das investigações, sobretudo em mulheres jovens, que também necessitam de contracepção. Royal College of Obstetricians and Gynaecologists: contraceptive choices for young people Opens in new window

História

Deve incluir o seguinte:[6][40][41][42][43]

  • Idade da menarca.

  • Início da dismenorreia: especialmente em relação à menarca. A dismenorreia primária geralmente ocorre 6-12 meses após o início da menarca. A dismenorreia secundária pode ocorrer na menarca ou vários anos após a menarca. As doenças obstrutivas do ducto paramesonéfrico se manifestam caracteristicamente nos primeiros ciclos, acompanhados de dor cíclica.

  • Características da dor: na dismenorreia primária, a dor é em forma de cólica no abdome inferior e irradia para as costas e coxas e é geralmente referida como dor "espasmódica". A dismenorreia secundária pode ser similar ou ser sentida como um peso pélvico e dorsalgia e é descrita como uma sensação "congesta".

  • Momento e duração da dor: a dismenorreia primária começa junto com a menstruação, ou algumas horas antes dela, e cessa completamente ao término do fluxo sanguíneo. A dismenorreia secundária geralmente começa antes do início da menstruação, aumenta progressivamente durante a fase lútea tardia e continua ao longo da menstruação.

  • Sintomas associados: a dismenorreia primária pode vir acompanhada de fadiga (85%), irritabilidade (72%), tonturas (28%), cefaleia (45%), dor lombar (60%), diarreia (60%), náuseas e vômitos (89%).

  • Fatores de exacerbação e alívio: é mais comum a dismenorreia secundária ser refratária a tratamentos simples como com os medicamentos anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) e a pílula contraceptiva oral combinada.

  • Gravidade dos sintomas: incluindo como eles interferem na atividade diária comum e como eles afetam a saúde mental, por exemplo, humor deprimido e ansiedade.

  • História menstrual: deve-se tentar obter informações sobre a extensão, duração, regularidade do ciclo menstrual e a quantidade do fluxo menstrual. Elas podem direcionar para uma causa secundária (como miomas uterinos, pólipos ou adenomiose) uma vez que o sangramento menstrual intenso não é comum em mulheres jovens com dismenorreia primária.

  • Sintomas adicionais: história de sangramento pós-coito, sangramento intermenstrual, corrimento vaginal ou dispareunia profunda devem ser investigados, pois estão associados à dismenorreia secundária.

  • História sexual: para identificar o status do parceiro e os fatores de risco para DIP, aspirações de fertilidade e uso de anticoncepcionais. A dismenorreia primária parece ser mais prevalente nas pacientes com história de abuso sexual.[42][43]

  • História obstétrica: deve-se perguntar sobre os planos de gestação e sobre história de infertilidade primária ou secundária.

  • História médica: existem várias doenças que podem mimetizar dor similar a da dismenorreia, como a síndrome do intestino irritável ou a intolerância à lactose. As condições de saúde mental associadas são comuns.

  • História familiar: deve-se registrar qualquer história similar na família. A endometriose geralmente afeta outros membros da família.

  • História medicamentosa: informações sobre medicamentos, drogas recreativas ou tabagismo.

Exame físico

O exame pélvico geralmente não apresenta nenhuma alteração digna de nota na dismenorreia primária e, em geral, não é indicado para as mulheres jovens que não são sexualmente ativas se os sintomas sugerem dismenorreia primária. No entanto, um exame pélvico completo pode ser adequado para mulheres sexualmente ativas e até mesmo para algumas adolescentes que não são sexualmente ativas, mas cuja dismenorreia não responde à terapia de primeira linha com os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) ou à terapia hormonal. Nesses casos, um exame pélvico consegue identificar todas as áreas de dor e descartar a presença de anatomia anormal ou massas pélvicas. O exame deve incluir uma inspeção cuidadosa dos órgãos genitais externos e um exame especular, seguido de um exame bimanual.

A ausência de achados clínicos não descarta a doença e o exame deve ser complementado com outros métodos de diagnóstico.

Achados sugestivos de uma patologia subjacente

  • Endometriose: achados positivos ao exame clínico, em 35% a 40% dos casos relacionados a sensibilidade anexial, retovaginal e uterina, associadas a excitação do colo do útero.[44]​ A doença mais avançada pode apresentar nódulos sensíveis à palpação acima dos ligamentos uterossacros e do septo retovaginal, sensibilidade à palpação de massas anexiais uni ou bilateralmente (endometrioma) e um útero imóvel fixo.

  • Doença inflamatória pélvica aguda ou crônica: desconforto abdominal inferior bilateral; dor à mobilização cervical e uterina ao exame pélvico e presença de sensibilidade anexial com ou sem massa. O exame especular, nos casos agudos, pode revelar corrimento vaginal ou cervical e aparência de cervicite.

  • Leiomioma uterino (miomas): sugerido por um útero móvel alargado que pode ser liso ou multinodular.

  • Adenomiose: um útero aumentado globular e sensível à palpação difusamente é frequentemente palpável durante o exame bimanual.

Investigações

Quando a anamnese e o exame clínico são sugestivos de dismenorreia primária, raramente é necessário realizar investigações adicionais.[45]

Poderão ser necessárias investigações adicionais caso ocorram sintomas inespecíficos, achados clínicos anormais, ineficácia do tratamento da dismenorreia primária, suspeita de dismenorreia secundária ou quando há dúvida no diagnóstico.

Exames de imagem

  • Miomas, doenças anexiais, endometriomas e dispositivos contraceptivos intrauterinos podem ser mais bem avaliados pela ultrassonografia pélvica. Muitas vezes, prefere-se a ultrassonografia transvaginal, pois ela oferece uma melhor resolução e permite um exame mais detalhado da pelve. Ela também pode revelar a presença de sensibilidade. Na presença de lesões intrauterinas como pólipos ou miomas submucosos, a sensibilidade e a especificidade da ultrassonografia transvaginal podem ser melhoradas com o uso de ultrassonografia com infusão de soro fisiológico.

  • A ultrassonografia tridimensional (3D) permite uma avaliação dos órgãos no plano coronal e pode ser superior na avaliação de uma doença endometrial.

  • Pode ser realizada ressonância nuclear magnética e tomografia computadorizada da pelve e/ou abdome quando os resultados ultrassonográficos são ambíguos.

  • A histerectomia pode ser indicada para avaliar uma doença intrauterina se os achados ultrassonográficos forem inconclusivos. Na presença de pólipos ou miomas submucosos, pode ser tentada ressecção subsequente.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Múltiplos pólipos identificados no exame histeroscópico da cavidade uterina nesta paciente com sangramento vaginal leve persistenteDo acervo do Dr. M.F. Mitwally and Dr R.J. Fischer; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.assessment.Caption@50ba7026[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Imagem histeroscópica de grande mioma uterino submucoso pedunculadoDo acervo do Dr. M.F. Mitwally and Dr R.J. Fischer; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.assessment.Caption@79f24a1e

leucócitos, velocidade de hemossedimentação, proteína C-reativa, hemograma completo

  • Uma contagem leucocitária aumentada acompanhada de VHS e proteína C-reativa elevadas pode ser evidência de uma doença inflamatória aguda ou crônica. Esses testes não são específicos e é possível que nem sempre os valores estejam elevados na doença leve, a qual caracteristicamente pode ser tratada ambulatorialmente. A contagem de leucocitária, a VHS e a proteína C-reativa também podem estar elevadas nos quadros clínicos não ginecológicos, como no caso de uma apendicite aguda.

  • O hemograma completo pode ser necessário para descartar anemia se houver sangramento menstrual intenso associado.

Swabs genitais

  • Clamídia (CT), gonorreia (GC) e Mycoplasma genitalium (MG) podem estar presentes no trato genital inferior nas mulheres com doença inflamatória pélvica (DIP), embora um swab negativo não descarte o diagnóstico. Um teste de amplificação de ácido nucleico (NAAT) combinado para CT/GC pode ser obtido na vulvovagina (autoavaliação) ou endocérvix. A implementação local do teste para MG pode variar fora dos cenários de medicina geniturinária especializada. Onde a microscopia direta for possível, a ausência de células de pus na vagina/endocérvix tem um alto valor preditivo negativo para DIP (>95%).[46]

Teste de gravidez urinário ou sérico

  • Para descartar a gestação em todas as mulheres que apresentam dor abdominal e pélvica e/ou menstruação irregular.

Laparoscopia

  • Auxilia no diagnóstico de endometriose, patologia anexial, adesões intra-abdominais e doença inflamatória pélvica e, ao mesmo tempo, pode oferecer tratamento para essas condições. Apesar disso, um estudo relatou que 35% das laparoscopias realizadas para dor pélvica ou dismenorreia secundária foram negativas.[47][Figure caption and citation for the preceding image starts]: imagem laparoscópica de nódulo endometrióticoDo acervo de Dr. Jonathon Solnik; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.assessment.Caption@69aeb1a3[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Imagem laparoscópica de endometrioma ovarianoDo acervo de Dr. Jonathon Solnik; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.assessment.Caption@31d3049d

Marcadores tumorais como antígeno CA-125

  • Devem ser verificados quando estiver presente uma massa ovariana. No entanto, trata-se de um teste inespecífico, e os níveis podem estar elevados na endometriose e em outras doenças como o câncer de ovário.

Biópsia endometrial com cânula de Pipelle

  • Pode ser necessária na presença de um padrão de sangramento anormal em mulheres com mais de 40 anos.

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