Abordagem
Os achados históricos e no exame físico geralmente estreitam consideravelmente o diagnóstico diferencial. Os testes iniciais a serem solicitados para um paciente que apresenta hipocalcemia são concentração total de cálcio sérico, albumina, magnésio, função renal e nível intacto de paratormônio sérico.[1]
História
A idade na qual a hipocalcemia e os sintomas e sinais hipocalcêmicos se manifestam é importante. Se a hipocalcemia ocorrer em uma idade precoce, as etiologias congênitas deverão ser investigadas. Se isso ocorrer em uma pessoa idosa que vive em uma instituição asilar, onde há pouca exposição ao sol, a deficiência de vitamina D será uma causa provável.
Uma história de cirurgia do pescoço aponta para as possíveis causas de hipocalcemia. Pacientes submetidos a tireoidectomia podem ter as glândulas paratireoides removidas, danificadas ou desvascularizadas acidentalmente. Outra causa de hipocalcemia após a cirurgia é a 'síndrome do osso faminto' que geralmente ocorre durante os 2 primeiros dias do pós-operatório da cirurgia de adenoma paratireoidiano. Esses pacientes precisam de reposição maciça de cálcio e magnésio.
Fadiga, fraqueza muscular, cólica e dor podem sugerir deficiência de vitamina D.
Dor abdominal com sinais de hipocalcemia sugere a possibilidade de pancreatite aguda.
A história medicamentosa pode alertar para causas iatrogênicas de hipocalcemia. Isso inclui o uso de inibidores da bomba de prótons, bifosfonatos, denosumabe, quimioterapia, agentes quelantes, glicocorticoides, anticonvulsivantes ou cloridrato de cinacalcete.[12][23][24][25][29]
Queixas crônicas de dormência e formigamento nas pontas dos dedos das mãos e dos pés e na região perioral podem indicar hipocalcemia.
A história familiar de hipocalcemia deve ser investigada.
Os pacientes que usam medicamentos imunossupressores e/ou com história de câncer da pele terão deficiência de vitamina D se seguirem rigorosamente o aconselhamento para evitar sol. Pessoas que rotineiramente usam filtro solar com FPS alto, têm pele morena e moram em latitudes setentrionais, usam roupas protetoras, ficam confinadas em casa ou têm má absorção das vitaminas lipossolúveis têm risco de deficiência de vitamina D grave. Fatores como sexo masculino, índice de massa corporal anormal, origem étnica não branca, tabagismo e privação socioeconômica também foram associados ao aumento do risco de deficiência de vitamina D.[31]
A presença de diarreia crônica com esteatorreia e doença intestinal, como doença de Crohn ou pancreatite crônica, pode sugerir hipocalcemia em decorrência da má absorção de cálcio ou vitamina D.
A desnutrição ou doença crônica pode resultar na redução da albumina circulante, que é uma das causas comuns de hipocalcemia.
Uma história de transfusões de sangue repetidas para anemia crônica ou defeitos do metabolismo do ferro (por exemplo, hemocromatose) ou metabolismo do cobre (por exemplo, doença de Wilson) e, menos comumente, uma neoplasia maligna atual, podem sugerir um processo infiltrativo nas glândulas paratireoides.[8][9]
Exame físico
Pacientes com hipocalcemia talvez não tenham sinais físicos.
O sinal de Trousseau pode ser aparente. Este é o espasmo carpopedal em resposta à isquemia que ocorre quando um manguito de pressão arterial é usado durante vários minutos.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Espasmo carpopedal (sinal de Trousseau) ocorrido alguns minutos após a insuflação do manguito do esfigmomanômetro acima da pressão arterial sistólicaPedrazzini B et al. BMJ Case Reports 2010;2010:bcr.08.2009.2188 [Citation ends].
O espasmo carpopedal que acontece na alcalose (por exemplo, em decorrência de hiperventilação) pode ocorrer em pacientes com hipocalcemia. Trata-se de um espasmo doloroso das mãos e dos pés que pode ser um sinal de apresentação, principalmente em pacientes com história de ataques de pânico/hiperventilação.
As arritmias podem se manifestar como batimentos cardíacos irregulares no exame.
Cicatrizes cirúrgicas curadas na base do pescoço podem indicar cirurgia da tireoide, que pode ter causado perda ou dano na glândula paratireoide.
O sinal de Chvostek (breve contração/espasmo dos músculos periorais, que resulta na contração do canto da boca, musculatura nasal ipsilateral e musculatura ocular ipsilateral) pode ser provocado estimulando-se o nervo craniano VII na orelha. O sinal de Chvostek não é sensível ou específico para hipocalcemia.[3]
Transtorno convulsivo ou cãibras musculares relacionados a tetania são sinais manifestos em pacientes com hipocalcemia grave.
Cifoescoliose em um paciente mais velho pode indicar osteoporose secundária à deficiência crônica de vitamina D ou à osteomalácia.
Manifestações neurológicas, como irritabilidade, sintomas extrapiramidais, transtorno de personalidade, coreoatetose e distonia, podem ser sinais de manifestação neurológica de calcificação cerebelar ou dos gânglios da base.[32]
Um curto quarto osso metacárpico (braquidactilia) é um sinal importante de pseudo-hipoparatireoidismo.[14]
Cataratas subcapsulares podem indicar hipocalcemia crônica.[4]
Edema do disco óptico pode ocorrer em casos graves de hipocalcemia. Pode ou não estar associado ao aumento da pressão intracraniana.[33]
A pele é seca, grossa e edemaciada em pacientes com hipocalcemia crônica. Também podem ocorrer hiperpigmentação e eczema, em raros casos. Podem ocorrer alterações nas unhas.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Distrofia ungueal decorrente da hipocalcemiaNijjer S et al. BMJ Case Reports 2010;2010:bcr.08.2009.2216 [Citation ends].
Pacientes com anormalidades congênitas podem se apresentar com características altamente variáveis, variando de leves distúrbios de aprendizagem ao espectro completo de malformações congênitas (como a tríade clássica de anormalidades cardíacas, timo hipoplásico e hipocalcemia observada na síndrome de DiGeorge) e outros aspectos de insuficiência velofaríngea (por exemplo, fenda palatina).
Avaliação laboratorial
Os testes iniciais incluem concentração total de cálcio sérico, albumina e magnésio, função renal e nível de paratormônio sérico intacto.
Outras investigações comumente incluem níveis séricos de cálcio ionizado, bicarbonato, fosfatase alcalina, fósforo e 25-hidroxivitamina D, bem como creatinina e cálcio urinário de 24 horas.[34]
Os níveis de cálcio sérico totais, ajustados para a albumina, devem ser os primeiros testes a serem executados em pacientes que apresentam sinais e sintomas de hipocalcemia.
A concentração da albumina sérica deve ser verificada, pois mais de 40% do cálcio circulante está ligado à albumina em uma razão de 0.8 mg de cálcio para 1 mg de albumina. Essa proporção é convencionalmente usada para ajustar o cálcio total após a medição da albumina. Usando unidades do SI (cálcio mmol/L; albumina g/L), a fórmula para cálcio sérico ajustado é:
(0.02 × [albumina normal - albumina do paciente]) + cálcio sérico.
Usando unidades convencionais (cálcio mg/dL; albumina g/dL), a fórmula para cálcio sérico ajustado é:
(0.8 × [albumina normal - albumina do paciente]) + cálcio sérico.
No entanto, a fórmula é substituída quando o cálcio ionizado é medido (quando disponível). A fórmula para cálcio ajustado talvez não seja confiável em todas as circunstâncias (como em pacientes em estado crítico).
O magnésio sérico deve ser medido quando houver suspeita de hipomagnesemia. A hipomagnesemia ou a hipermagnesemia grave podem causar hipocalcemia e podem indicar a etiologia subjacente. Qualquer causa de hipomagnesemia (por exemplo, uso de inibidores da bomba de prótons [IBPs]) pode resultar em hipocalcemia.[12][29] É importante identificar a hipomagnesemia, pois o cálcio não pode ser ajustado adequadamente a menos que o magnésio tenha sido reposto. A hipomagnesemia secundária ao uso de IBP só pode ser ajustada ao se interromper o IBP.
Função renal: níveis elevados de ureia e creatinina podem indicar disfunção renal.
Níveis de paratormônio (PTH) intacto devem ser testados em todos os pacientes com hipocalcemia. Os níveis de paratormônio (PTH) serão baixos em hipoparatireoidismo observável (por exemplo, iatrogenia ou dano infiltrante, ausência congênita) e serão elevados em deficiência de vitamina D, doença renal e malignidades com metástases ósseas.
Os níveis de 25-hidroxivitamina D devem ser medidos em pacientes nos quais se suspeita terem deficiência de vitamina D. A fosfatase alcalina sérica também pode ser útil nesses pacientes (nos quais os níveis podem ser elevados). A fosfatase alcalina aumenta em pacientes com metástases ósseas.
Devem ser obtidos exames de bioquímica sérica, incluindo cálcio (ionizado), bicarbonato, fosfatase alcalina e fósforo: altos níveis de fosfato na ausência de insuficiência renal e degradação tecidual indicam hipoparatireoidismo ou pseudo-hipoparatireoidismo.
Os níveis de amilase e/ou lipase devem ser verificados em pacientes com dor abdominal. Na pancreatite aguda, os níveis de amilase e lipase estão significativamente aumentados.[35] Use o teste da lipase sérica preferencialmente em vez da amilase sérica.[36]
Os níveis de creatinina sérica, creatina quinase, magnésio e fósforo são testes particularmente relevantes em pacientes com suspeita de rabdomiólise e síndrome da lise celular.
As contagens de células T são úteis na suspeita de síndrome de DiGeorge, na qual a linfopenia de células T é observada comumente. As análises de hibridização fluorescente in situ podem confirmar a deleção de 22q11.2.
O eletrocardiograma (ECG) deve ser executado para avaliar arritmias e intervalos QT prolongados. A hipocalcemia prolonga o potencial de ação da fase II, resultando em intervalos QT prolongados, que podem ser o único sinal de hipocalcemia no eletrocardiograma.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Eletrocardiograma (ECG) que mostra um intervalo QT ajustado (QTc) de 503 ms durante o ritmo sinusalNijjer S et al. BMJ Case Reports 2010;2010:bcr.08.2009.2216 [Citation ends].
Exames de imagem
As radiografias devem ser executadas quando forem observadas múltiplas fraturas ou sinais de osteomalácia.
Deve-se executar uma cintilografia óssea com isótopo em pacientes com possíveis metástases malignas.
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