Abordagem
O tremor deve ser diferenciado de outros movimentos involuntários (por exemplo, mioclonia, coreia, distonia e tiques). Uma vez identificado o tremor, deve-se considerar inicialmente se ele é de repouso ou de ação.
História
Uma história abrangente deve explorar o tipo, o início, os fatores de exacerbação e alívio, a região do corpo afetada, medicamentos, possível exposição a toxinas, história familiar e sintomas associados. Também deve avaliar as limitações funcionais (por exemplo, segurar um copo, escrita a mão, dificuldade social).
As principais considerações incluem:
Tremor de repouso versus tremor de ação: pacientes com tremor de repouso geralmente notam o tremor quando o membro afetado está em repouso. Por exemplo, os pacientes geralmente percebem o tremor da mão em repouso quando estão sentados em uma poltrona assistindo à TV ou quando se deitam para dormir. Os tremores de ação geralmente interferem na realização das atividades da vida diária, como escrever, segurar um copo, servir-se, maquiar-se, abotoar-se ou qualquer atividade que exija maior destreza. Também é importante identificar se o tremor ocorre apenas com uma atividade específica.
Idade de início do tremor: embora a doença de Parkinson (DP) possa ocorrer em qualquer idade, a faixa média de idade de aparecimento dos sintomas é 58-62 anos. A prevalência e a incidência do tremor essencial aumentam com a idade, mas ele pode aparecer no início da fase adulta em pessoas com história familiar da afecção. A doença de Wilson geralmente ocorre em pacientes <40 anos de idade, portanto, isso deve ser considerado em qualquer tremor atípico, especialmente se o tremor se desenvolver em pacientes <40 anos de idade.
Natureza do aparecimento do tremor: a maioria dos tremores tem um início gradual e é observada intermitentemente antes de ocorrer constantemente. Uma causa funcional (psicogênica) deve ser considerada se um tremor significativo iniciar-se abruptamente.
Região do corpo afetada: A DP geralmente afeta os braços, pernas e queixo, mas raramente causa tremor de cabeça. O tremor essencial envolve as mãos, a cabeça e a voz, mas poucas vezes atinge as pernas. O tremor da cabeça isolado pode sugerir um tremor distônico.
Fatores de exacerbação e agravamento: a maioria dos tremores piora com o estresse, a ansiedade, o frio e a fadiga. A ingestão de álcool pode levar à supressão do tremor essencial e do tremor distônico.[15]
Medicamentos: a lista de medicamentos deve ser cuidadosamente analisada. Qualquer um dos seguintes medicamentos pode causar tremor: neurolépticos, antipsicóticos atípicos, agentes antieméticos (metoclopramida, proclorperazina, prometazina), bloqueadores dos canais de cálcio (flunarizina, cinarizina), depletores de dopamina (tetrabenazina), antidepressivos (tricíclicos, inibidores da recaptação de serotonina, inibidores da monoamina oxidase), estabilizadores de humor (lítio), medicamentos antiepilépticos (ácido valproico), antiarrítmicos (amiodarona), imunossupressores (ciclosporina, tacrolimo, corticosteroides) , medicamentos antiasmáticos (salbutamol, teofilina) e estimulantes (anfetaminas).
História social: uma história de abuso de álcool pode alertar o examinador para uma síndrome da abstinência alcoólica. O uso indevido de medicamentos, especialmente anfetaminas, está frequentemente associado aos tremores de ação. Os médicos também devem perguntar sobre o uso de cafeína.
História familiar: aproximadamente 50% dos pacientes com tremor essencial têm história familiar positiva (padrão autossômico dominante). Nos pacientes com síndrome de tremor e ataxia associada ao X-frágil (FXTAS), pode haver história de insuficiência ovariana prematura em membros da família do sexo feminino ou deficiência intelectual em membros da família do sexo masculino.[13]
Revisão dos sintomas: uma revisão cuidadosa deve ser conduzida com ênfase em sintomas parkinsonianos (micrografia, lentidão de movimentos, sialorreia, disfagia, andar arrastado, anormalidades posturais, hipofonia, distúrbio de comportamento do sono com movimento rápido dos olhos, sentido de olfato reduzido, constipação, frequência urinária); presença de prejuízo cognitivo; presença de incoordenação, quedas ou sintomas visuais; comorbidades como esclerose múltipla, trauma, acidente vascular cerebral ou hipertensão e neuropatia; sudorese, taquicardia, palpitações e perda de peso; histórico psiquiátrico (p. ex., ansiedade ou depressão); e sensações de arranque ou contrações musculares que sugiram distonia.
Observação
Inicialmente, o tremor deve ser diferenciado de outros movimentos involuntários. Por exemplo:
A mioclonia apresenta puxões ou pausas tipo choque na atividade muscular e é geralmente irregular.
A coreia se refere aos movimentos irregulares, não estereotipados, aleatórios e fluentes dos membros (geralmente distais), face ou tronco.
A distonia é a contração muscular sustentada resultando em postura retorcida ou anormal de uma parte do corpo. O tremor distônico se refere ao tremor que ocorre em uma parte do corpo afetada pela distonia.
A mioclonia consiste em contração e relaxamento muscular anormais que se alternam rapidamente, em geral eliciados por um membro espástico estendido.
Os tiques são movimentos repetitivos e estereotipados que podem ser simples ou complexos e geralmente são precedidos por uma sensação de tensão. Os tiques podem ser diferenciados de outros movimentos por poderem ser suprimidos.
A epilepsia parcial contínua é uma forma de estado de mal epiléptico parcial com manifestações motoras simples que são mantidas por >1 hora, com atividade clônica restrita a uma parte do corpo e recorrendo a intervalos bastante regulares.
As fasciculações são contrações musculares menores, locais e involuntárias, visíveis sob a pele, que se originam da descarga espontânea de um feixe de fibras musculares esqueléticas.
Uma vez identificado o tremor, sua classificação é de suma importância. O tremor deve ser observado e diferenciado como um tremor de repouso ou de ação. Para o tremor da mão, deve-se observar o paciente com as mãos em repouso sobre o colo, com as mãos mantidas retas em sustentação e, por fim, com os braços dobrados no cotovelo e as mãos em frente à face. Um tremor postural pode estar presente em apenas 1 posição. O paciente deve ser solicitado a realizar movimentos de dedo-nariz e dedo-no-dedo. Se houver tremor de repouso e houver suspeita de doença de Parkinson, deve-se observar se a distribuição é unilateral ou assimétrica e se há bradicinesia ou rigidez. Se houver suspeita de tremor funcional (psicogênico), é importante verificar se há distração do tremor ou outros sinais não-orgânicos, como sensação de fraqueza. Também pode ser útil observar o paciente bebendo em um copo ou escrevendo. O tremor deve ser classificado de acordo com a parte do corpo (por exemplo, braços, pernas, cabeça), quando ocorre, sua frequência e sua amplitude (ou seja, delicado ou grosseiro). Se o tremor envolver a cabeça, o médico deve observar a postura distônica da cabeça e do pescoço.
Exame neurológico
Deve-se realizar um exame neurológico detalhado em todo paciente com tremores. O estado mental deve ser examinado para se investigarem comprometimentos cognitivos e avaliar a fala. O teste dos nervos cranianos é importante para descartar achados que possam ser atribuídos à paralisia supranuclear progressiva (comprometimento dos movimentos oculares voluntários mais verticais que horizontais), esclerose múltipla (defeito pupilar aferente, oftalmoplegia internuclear) ou AVC (paralisia facial, corte do campo visual) ou atrofia de múltiplos sistemas (nistagmo, movimentos sacádicos dismétricos).
O teste da função cerebelar é importante para identificar a ataxia, mas também para investigar um possível tremor cinético. O exame sensorial pode descartar a neuropatia. O exame da marcha pode revelar arrastamento dos pés, giro do braço reduzido ou dificuldade de caminhar em tandem. Os reflexos assimétricos podem sugerir uma causa central para o tremor.
Investigações
Investigações laboratoriais, incluindo o perfil metabólico básico (com testes da função hepática e cálcio sérico), podem ser úteis para descartar algumas causas metabólicas do tremor. Os testes da função tireoidiana devem ser realizados em todos os pacientes que apresentarem tremor de ação. Para os pacientes com suspeita de demência com corpos de Lewy, os níveis de hormônio estimulante da tireoide e vitamina B12 ajudarão a descartar causas reversíveis de comprometimento cognitivo. Para os pacientes com suspeita de doença de Wilson, a determinação do cobre urinário em 24 horas e da ceruloplasmina sérica auxiliarão o diagnóstico; o exame dos olhos usando lâmpada de fenda para observação dos anéis de Kayser-Fleischer também pode ser útil.
Nos pacientes com suspeita de DP, uma resposta positiva a um agente dopaminérgico enfaticamente sugere o diagnóstico. Em pacientes com suspeita de DP e características atípicas (por exemplo, evolução atípica, demência, desequilíbrio significativo na doença em estágio inicial, disfunção autonômica, anormalidades do olhar ou anormalidades atípicas nos exames neurológicos), uma ressonância nuclear magnética (RNM) do crânio deve ser considerada.[16] Para outros tremores de repouso, a RNM ou a tomografia computadorizada (TC) do crânio deve ser considerada para descartar causas estruturais do parkinsonismo. A tomografia por emissão de pósitrons (PET) e a tomografia computadorizada por emissão de fóton único (SPECT) podem detectar anormalidades do sistema dopaminérgico que podem ajudar a distinguir o parkinsonismo do tremor essencial. Os traçadores do PET e SPECT ligam-se tipicamente ao transportador de dopamina ou transportador de monoamina vesicular para fornecer uma ideia da integridade da dopamina terminal. A imagem por SPECT com transportador de dopamina (123)I-ioflupano (DaTscan) pode ser considerada para diferenciar o tremor parkinsoniano do tremor essencial, quando for difícil distinguir essas condições clinicamente.
Os estudos de RNM e TC também são importantes em casos de tremor de intenção quando há suspeita de AVC, tumor ou esclerose múltipla.
A testagem genética é necessária para a suspeita de FXTAS.
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