Etiologia
As principais causas da hipocalemia são ingestão reduzida de potássio, aumento da entrada de potássio nas células, aumento da excreção de potássio (por exemplo, a partir do trato gastrointestinal ou através da urina ou do suor) e em situações especiais como durante a diálise ou a plasmaférese.[2][Figure caption and citation for the preceding image starts]: Causas do aumento da excreção de potássioDo acervo de Sumit Sharma, Universidade de Iowa [Citation ends].
Diminuição na ingestão de potássio
É raro a hipocalemia ser causada por uma diminuição na ingestão de potássio. Entretanto, isso poderá ocorrer se houver uma redução na ingestão de potássio em condições como a anorexia nervosa, no decorrer da terapia diurética ou com dietas hipocalóricas ricas em proteínas para rápida perda de peso.[3]
Aumento da entrada de potássio nas células
Isso pode ocorrer por meio de vários mecanismos.
Elevação no pH extracelular: a alcalose metabólica ou respiratória pode facilitar a entrada de potássio nas células (os íons de hidrogênio saem e o potássio entra nas células para manter a eletroneutralidade). A administração de bicarbonato de sódio para tratar a acidose metabólica também pode causar este fenômeno.
Aumento da atividade beta-adrenérgica: as catecolaminas promovem a entrada de potássio nas células ao aumentar a atividade da Na-K-adenosina trifosfatase (Na-K-ATPase).[4] A administração de um agonista beta-adrenérgico como salbutamol ou terbutalina (por exemplo, para tratar asma ou para impedir o parto prematuro), ou a intoxicação por teofilina também pode causar a hipocalemia.[5] A hipocalemia transitória também pode ocorrer durante a liberação induzida por estresse de adrenalina e cortisol (por exemplo, durante a doença aguda ou isquemia coronariana).[6]
Disponibilidade aumentada de insulina: a insulina promove a entrada de potássio nas células do músculo esquelético e do fígado ao aumentar a atividade da Na-K-ATPase.[4] Essa ação fisiológica da insulina é mais proeminente após sua administração em pacientes com cetoacidose diabética ou estado hiperosmolar hiperglicêmico.[7] A concentração plasmática de potássio também pode ser reduzida por uma grande carga de carboidrato.
Paralisia periódica hipocalêmica: é um distúrbio raro caracterizado por episódios potencialmente fatais de fraqueza muscular ou paralisia, podendo afetar os músculos respiratórios. Pode ser desencadeada por exercícios, estresse ou condições associadas à liberação de adrenalina, cortisol, aldosterona ou insulina.[8] Ataques agudos podem reduzir as concentrações de potássio no plasma para 1.5 a 2.5 mmol/l (1.5 a 2.5 mEq/L) e frequentemente são acompanhados por hipofosfatemia e hipomagnesemia.[9] O excesso de hormônio tireoidiano aumenta a atividade da Na-K-ATPase e pode aumentar a predisposição a episódios paralíticos, aumentando a suscetibilidade à ação hipocalêmica da adrenalina ou insulina.[10]
Produção aumentada de células sanguíneas durante estados anabólicos: o aumento da entrada de potássio nas células pode ser causada por aumentos intensos na produção de células hematopoiéticas que ocorre com o uso do fator estimulador de colônias de granulócitos e macrófagos (GM-CSF) na neutropenia.[11] Isso também pode ocorrer após a administração de vitamina B12 ou de ácido fólico na anemia megaloblástica.[11]
Intoxicação por cloroquina: a hipocalemia é um achado comum na intoxicação aguda por cloroquina.[12] É causada pelo movimento de potássio para dentro das células e pode ser exacerbada pelo uso de adrenalina para auxiliar no tratamento da intoxicação.
Hipotermia: há relatos de que a hipotermia possa resultar na condução de potássio para dentro das células, a qual está associada à diminuição da concentração de potássio no plasma para um nível abaixo de 3.0 a 3.5 mmol/L (3.0 a 3.5 mEq/L).[13] Isso é reversível quando há reaquecimento. A suplementação de potássio durante a hipotermia também pode causar um aumento significativo na concentração de potássio sérico no reaquecimento.[14]
Perdas do trato gastrointestinal
A perda de secreções gástricas ou intestinais causada por qualquer motivo (vômitos, diarreia, laxantes ou drenagem por tubo) pode provocar a hipocalemia.[11]
Vômitos: quando intensos ou recorrentes, também podem causar perda renal de potássio em caso de alcalose metabólica.
A hipocalemia decorrente de perdas gastrointestinais é mais comum quando elas ocorrem durante um período prolongado, assim como ocorre em outras condições como adenoma viloso ou tumor secretor de peptídeo vasoativo intestinal (VIPoma).[15][16]
Alça/conduto ileal com implantes uretéricos: pode levar a perdas de potássio.
Solução oral de fosfato sódico: é usada na limpeza intestinal e está associada a perdas gastrointestinais de potássio. Tem maior probabilidade de ocorrer em idosos e naquelas com motilidade gastrointestinal reduzida.[17]
Aumento da perda de potássio na urina
Uma grande variedade de causas está associada à perda de potássio na urina.
Diuréticos (por exemplo, acetazolamida, diuréticos de alça e diuréticos tiazídicos): estes aumentam o fornecimento distal de potássio e ativam o sistema renina-angiotensina-aldosterona. A excreção de potássio urinário aumenta e pode levar à hipocalemia se as perdas não corresponderem à ingestão de potássio.
Excesso de mineralocorticoides: a perda urinária de potássio também é característica de qualquer condição associada à hipersecreção primária de mineralocorticoides (aldosteronismo primário) ou à hipersecreção de catecolaminas por meio da liberação de renina. O excesso aparente de mineralocorticoides, caracterizado por edema, hipertensão e hipocalemia, ocorre em doenças de deficiência congênita ou deficiência de 11-beta-hidroxiesteroide desidrogenase renal do tipo 2 ou sua inibição por ingestão crônica de alcaçuz, alcoolismo agudo, doenças hepática ou renal crônicas, pré-eclâmpsia, síndrome de secreção ectópica de hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) e/ou hipertensão induzida pela gestação.[1][18][19][20][21][22][23][24] Uma causa incomum do excesso de mineralocorticoides é a hiperplasia adrenal congênita provocada pela deficiência de 11-beta-hidroxilase.
Nefropatia perdedora de sal: certas doenças renais associadas à diminuição da reabsorção de sódio nos túbulos proximal, distal ou na alça podem, de maneira não frequente, levar à hipocalemia por meio de um mecanismo semelhante ao mecanismo induzido por diuréticos. As síndromes de Bartter ou de Gitelman, doenças túbulo-intersticiais (decorrentes da síndrome de Sjögren ou lúpus) e a lesão dos túbulos renais em pacientes com leucemia também podem causar hipocalemia por esses mecanismos.[25][26][27][28]
Presença de ânions não reabsorvíveis: pode ocorrer um aumento acentuado na excreção de potássio através da reabsorção de sódio em vez de potássio durante vômitos ou durante a acidose tubular renal do tipo 2, ou o betahidroxibutirato na cetoacidose diabética, ou pode ser induzida por medicamentos.[29][30] Nessas condições, uma diminuição no fornecimento de cloreto distal e a secreção intensificada de aldosterona também promovem a secreção de potássio.[31]
Acidose metabólica: a perda de potássio ocorre na acidose tubular renal do tipo 1 (distal) e do tipo 2 (proximal). Em cada uma dessas doenças, o grau de depleção de potássio é mascarado pelo efluxo de potássio para fora das células, provocado pela acidemia.
Anfotericina B: a hipocalemia ocorre em até metade dos pacientes tratados com anfotericina B.[32] A anfotericina aumenta a permeabilidade da membrana, promovendo a secreção de potássio através da membrana luminal, mas também pode causar acidose tubular renal do tipo 1 de forma concomitante, a qual pode ter um papel contribuidor na hipocalemia.
Hipomagnesemia: magnésio sérico <0.75 mmol/L (<1.5 mEq/L) presente em até 40% dos pacientes com hipocalemia.[33][34] A hipomagnesemia pode levar ao aumento da perda urinária de potássio por meio de um mecanismo incerto, possivelmente envolvendo amento no número de canais de potássio abertos. A presença de hipocalcemia geralmente é um indício de hipomagnesemia subjacente. É importante determinar se há hipomagnesemia, pois, geralmente, só é possível corrigir a hipocalemia depois da correção do deficit de magnésio.[35]
Poliúria: tem maior probabilidade de ocorrer na polidipsia primária (geralmente psicogênica), na qual o débito urinário pode estar elevado durante um período de tempo prolongado.[36] A poliúria também pode ocorrer no diabetes insípido central, embora os pacientes tipicamente procurem atendimento médico assim que a poliúria se manifesta.
Aumento da perda por meio de sudorese
Exercícios físicos em clima quente podem produzir mais de 10 L de suor diariamente, levando à depleção de potássio se as perdas não forem repostas.[37]
A excreção urinária de potássio também pode ser um fator contribuinte, uma vez que a liberação de aldosterona é intensificada tanto pelo exercício (por meio da secreção de renina induzida por catecolamina) quanto pela perda de volume.
A perda significativa de potássio no suor também pode ocorrer em pacientes com fibrose cística.[38]
Queimaduras e outras condições dermatológicas (ou seja, eczema ou psoríase, envolvendo uma grande área de superfície da pele, especialmente com o uso de esteroides tópicos) podem causar aumento de perda de potássio através da pele.
Diversa
O alcoolismo crônico é uma causa comum de hipocalemia.[39] A hipocalemia ocorre por vários motivos, como dieta deficiente, associada a vômitos e hiperaldosteronismo secundário.
A hipocalemia pode ser induzida em alguns pacientes por diálise de manutenção. As perdas de potássio podem atingir até 30 mmol/dia (30 mEq/dia) em pacientes em diálise peritoneal crônica. Isso pode se tornar clinicamente importante se a ingestão de potássio for reduzida ou se houver perdas gastrointestinais concomitantes.[40]
A hipocalemia pode complicar a plasmaférese.[41] O uso de albumina como fluido de substituição pode causar hipocalemia dilucional transitória.[42]
A síndrome de Liddle é causada por uma mutação que cria hiperatividade do canal de sódio sensível à amilorida, levando a hipertensão grave de início precoce, hipocalemia e alcalose metabólica com baixo nível de renina e aldosterona no plasma.[43]
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