Abordagem
Assim que a acidose respiratória é identificada pela análise da gasometria arterial, a abordagem de definição do diagnóstico diferencial e a determinação da gravidade da condição do paciente são auxiliadas pela identificação de severidade (aguda ou crônica). Isso é feito por meio da síntese das informações da gasometria arterial, da história e do exame físico.[9]
Achados na história podem identificar imediatamente a causa subjacente, como trauma cranioencefálico e ingestão de medicamentos, ou fornecer apenas informações limitadas, como com paciente obnubilado.
O exame físico deve se concentrar na avaliação dos sistemas neurológico e respiratório, com exame cuidadoso dos campos pulmonares, o que pode gerar informações úteis sobre a presença de doença parenquimatosa subjacente.
Novos exames laboratoriais são necessários quando anormalidades metabólicas ou doenças sistêmicas específicas são etiologias suspeitas. Imagens radiográficas são fundamentais para a avaliação da acidose respiratória, pois podem fornecer um rastreamento rápido da patologia cranioencefálica, cervical ou torácica.
Análise da gasometria arterial
Passo 1: Há acidose?
A acidose é indicada por um pH de gasometria arterial abaixo da faixa normal (ou seja, <7.35)
Passo 2: Respiratória ou metabólica?
A acidose respiratória é indicada por um aumento nos níveis de dióxido de carbono arterial acima da faixa normal de 35 a 45 mmHg (4.7-6.0 kPa).
É importante observar que o grau de acidose e as possíveis preocupações são diferentes, dependendo se o problema é respiratório ou metabólico.
Um pH equivalente em acidose metabólica (por exemplo, 7.0) é um sinal clínico muito pior, pois o corpo tem mecanismos duplos de tamponamento e compensação para o ácido metabólico (o sistema carbamato-bicarbonato: tamponamento por bicarbonato e eliminação de dióxido de carbono). Por outro lado, o dióxido de carbono elevado causa uma queda drástica no pH, mas o paciente está menos doente porque a capacidade de tamponamento do dióxido de carbono é menor. Estudos em pacientes críticos têm demonstrado que pacientes toleram muito bem a acidose hipercápnica.
Passo 3: A acidose respiratória é aguda ou crônica?
Saber se a acidose respiratória é aguda ou crônica é extremamente importante, pois ajuda a identificar a causa subjacente da acidose e avaliar a gravidade do quadro clínico do paciente.
A acidose respiratória aguda costuma ter um quadro clínico mais grave (geralmente com risco de vida) que o da acidose respiratória crônica.
Na acidose respiratória aguda, para cada aumento de 10 mmHg na PaCO₂, o pH diminuirá 0.08 e o excesso de base e bicarbonato sérico ficará dentro da faixa normal devido à natureza aguda do processo subjacente.
Para calcular a compensação esperada em acidose respiratória crônica, lembre-se de que o pH em acidose respiratória crônica diminui somente em 0.03 unidades para cada aumento de 10 mmHg em PaCO₂. Para pacientes com acidose respiratória crônica compensada (por exemplo, em DPOC), o pH será normal apesar de um valor elevado de PaCO₂.
Mecanismos renais de compensação podem corrigir a acidose respiratória em 24 horas.
Alterações do pH fora dessas faixas sugerem uma anormalidade metabólica sobreposta (acidose ou alcalose).
A acidose respiratória aguda geralmente é causada por:
Uso de drogas (narcóticos, álcool, sedativos e anestésicos)
Oxigenoterapia em DPOC
Exacerbação de DPOC (causa acidose respiratória aguda ou crônica)
Hipocalemia e hipofosfatemia
Crise asmática
Aspiração de corpo estranho
Pneumonia multilobar
Derrame pleural
Pneumotórax
Ventilação mecânica inadequada
Infarto do sistema nervoso central (SNC) ou hemorragia
Trauma cranioencefálico
Infecção do SNC.
Outras causas importantes, porém incomuns de acidose respiratória aguda são:
Edema pulmonar cardiogênico
Laringoespasmo
Angioedema
Sepse
Febre/hipertermia maligna.
A acidose respiratória crônica geralmente é causada por:
Doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC)
Síndrome da hipoventilação na obesidade
Obesidade
Hipotireoidismo
Cifoescoliose.
Passo 4: Há hipoxemia?
A presença de hipoxemia com acidose respiratória pode ajudar a limitar o diagnóstico diferencial.
A hipoxemia pode ocorrer com processos que causam hipoventilação alveolar profunda, como overdose sedativa e infarto do sistema nervoso central (SNC), ou desequilíbrio ventilação-perfusão regional, como pneumonia multilobar.
História
Início dos sintomas
O grau da severidade e da magnitude dos sintomas ajuda a limitar o diagnóstico diferencial.
A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) costuma se manifestar com acidose respiratória aguda ou crônica devida a uma exacerbação causada por infecção do trato respiratório inferior, embolia pulmonar, pneumotórax (por causa da ruptura bolhosa) ou cor pulmonale.
Febre, tosse, dor torácica pleurítica e hipóxia sugerem um processo parenquimal subjacente como pneumonia ou empiema.
Condições crônicas, incluindo síndrome da hipoventilação na obesidade, esclerose múltipla, miastenia gravis e cifoescoliose, podem ser associadas a poucos ou nenhum sintoma.
Causas agudas de acidose respiratória geralmente se manifestam com sintomas mais claros, como fraqueza neurológica ascendente rapidamente progressiva sugestiva de síndrome de Guillain-Barré.
Quadros clínicos preexistentes
A presença de doenças crônicas associadas à acidose respiratória, incluindo DPOC, miastenia gravis e esclerose múltipla, pode ajudar a determinar a causa subjacente.
A presença de doença aterosclerótica ou fibrilação atrial aumenta a probabilidade de patologia do sistema nervoso central (SNC), ou seja, de infarto.
Uma história de depressão pode aumentar a suspeita de ingestão de substâncias tóxicas.
História medicamentosa
Narcóticos e analgésicos podem causar depressão respiratória.
Um aumento recente na taxa de fluxo de oxigênio contínuo em um paciente com DPOC pode causar hipoventilação.
O uso de inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA) ou bloqueadores do receptor de angiotensina aumenta o risco de angioedema.
Sonolência diurna excessiva e cefaleias ao acordar são observadas na síndrome da hipoventilação na obesidade.
Exame físico
Exame pulmonar
Achados anormais na ausculta pulmonar (egofonia, estertores, sibilos, macicez à percussão) podem ajudar a localizar a patologia torácica, mas são inespecíficos.
Padrões de respiração obstruída incluem movimentos torácicos variáveis, batimento da asa do nariz e recessão supraclavicular e subcostal.
Movimento paradoxal de uma parte da parede torácica com respiração espontânea sugere tórax instável.
Exame cardíaco
Ictus do ventrículo direito e regurgitação tricúspide sugerem insuficiência crônica do ventrículo direito (cor pulmonale) associada à doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e à síndrome da hipoventilação na obesidade.
Um ritmo cardíaco irregular, sopros valvares ou sopros carotídeos podem sugerir uma origem embólica caso um evento do sistema nervoso central (SNC) esteja presente.
Exame neurológico
Obnubilação, anisocoria e reflexo pupilar unilateral anormal indicam um possível infarto do tronco encefálico.
Asterixis (flapping), mioclonia, convulsões ou miose podem estar presentes dependendo da substância ingerida.
Hiporreflexia/arreflexia simétricas dos membros inferiores é um sinal cardíaco da síndrome de Guillain-Barré.
Avaliação laboratorial
Medição dos eletrólitos séricos
Para avaliar os níveis de potássio e fosfato.
Hemograma completo
Para avaliar policitemia ou contagem leucocitária elevada
Exames toxicológicos
Indicados no paciente obnubilado para verificar a presença de depressivos farmacológicos.
Punção lombar
Útil para procurar por infecção do sistema nervoso central (SNC).
Exames específicos para rastrear doenças sistêmicas
Hormônio estimulante da tireoide para hipotireoidismo.
Anticorpo contra o receptor da acetilcolina para miastenia gravis
Ensaio funcional do inibidor de esterase C1 para angioedema hereditário
Anticorpos antinucleares para esclerodermia
Antígeno leucocitário humano B27 (HLA-B27) para espondilite anquilosante.
Exames microbiológicos
Microscopia, cultura e sensibilidade da expectoração para avaliação de pneumonia.
Biópsia muscular
Indicada se houver suspeita de distrofia muscular, hipertermia maligna, polimiosite ou dermatomiosite.
Exames de imagem
A radiografia torácica e a tomografia computadorizada (TC) são fundamentais para rastreamento da doença pulmonar e da parede torácica subjacente. A radiografia torácica é a modalidade de imagem mais rápida e mais prontamente disponível para rastrear as causas de acidose respiratória. Geralmente, a TC pode agregar mais informações.
Imagens cranioencefálicas obtidas com TC ou ressonância nuclear magnética (RNM) são indicadas para rastrear trauma cranioencefálico, acidente vascular cerebral (AVC) ou hemorragia.
Polissonografia noturna é uma ferramenta de rastreamento útil para síndrome da hipoventilação na obesidade e hipoventilação alveolar primária.
Fluoroscopia dinâmica com inspiração profunda (sniff teste) pode diagnosticar danos no nervo frênico.
Eletromiografia e teste de condução nervosa demonstram denervação difusa e amplitude anormal dos potenciais de ação musculares compostos com velocidades de condução preservadas em esclerose lateral amiotrófica.
Teste de função pulmonar
A capacidade vital forçada (CVF) e as pressões máximas de inspiração e expiração são usadas para avaliar a integridade do sistema respiratório em síndrome de Guillain-Barré e miastenia gravis.
A CVF e as pressões máximas de inspiração e expiração devem ser monitoradas em todos os pacientes com distúrbios neuromusculares que afetam os músculos da parede torácica e o diafragma.[10]
Volumes reduzidos do pulmão são observados em cifoescoliose e obesidade.
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