Considerações de urgência

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A rápida avaliação e estabilização de um paciente com estado mental alterado é obrigatória, para incluir a avaliação imediata de vias aéreas, respiração, circulação e sinais vitais. Essa avaliação inclui a verificação e o tratamento das causas reversíveis de estado mental alterado (por exemplo, administrando oxigênio, tiamina, glicose, naloxona), a obtenção de uma medição precisa da temperatura, a solicitação de uma tomografia computadorizada (TC) de emergência do crânio se houver sinais de trauma, administração de antibióticos empíricos (e/ou antivirais) se o paciente apresentar febre e a realização de outras manobras básicas adequadas às circunstâncias. Deve-se administrar tiamina antes da glicose se houver suspeita de encefalopatia de Wernicke.

Eventos neurológicos agudos

Diagnóstico inicial de acidente vascular cerebral (AVC) ou ataque isquêmico transitório, traumatismo cranioencefálico, hematoma epidural ou subdural, hemorragia subaracnoide, convulsões, meningite, encefalite, abscessos cerebrais e neurossífilis podem resultar em estado mental alterado.[11] É prudente realizar uma avaliação neurológica, com tomografia computadorizada (TC) e/ou ressonância nuclear magnética (RNM).

As investigações nos pacientes com sinais de encefalopatia hipertensiva devem ser focadas em todos os sinais de danos dos órgãos-alvo. Em casos de emergências hipertensivas agudas, o objetivo inicial da terapia é reduzir a pressão arterial (PA) média em não mais que 25% (em minutos a até 1 hora) e, depois, se o paciente estiver estável, reduzir para 160/100 a 110 mmHg nas próximas 2 a 6 horas.[12][13]

Delirium (um nível flutuante, agudo, de consciência e cognição, caracterizado pela falta de atenção e pensamento desorganizado) é uma emergência clínica que requer uma investigação imediata.[8][14] História ou sinais que indiquem uma doença clínica geral, como infecção, distúrbio metabólico ou toxicidade farmacológica podem, por vezes, ser esclarecidos. Os exames iniciais a serem solicitados incluem hemograma completo, perfil metabólico, glicemia de jejum, urinálise e urocultura. Investigações e tratamentos adicionais são orientados pela história clínica e pelo exame físico. O delirium em pacientes idosos internados em hospitais é frequentemente persistente (até 21% dos pacientes idosos nos 6 meses seguintes à alta).[15] Tem sido consistentemente demonstrado que pacientes com delirium persistente apresentam piores desfechos clínicos, incluindo maior risco de perder sua independência e estar sob cuidados por um longo período.[15]

Infecção sistêmica grave

É imperativo considerar infecções ocultas (sistema nervoso central, pele, coração, pulmão, abdome, geniturinário), uma vez que o reconhecimento e o tratamento precoces de sepse ou choque séptico são essenciais para melhorar os desfechos.[16][17][18] Um estado mental alterado pode ser o único sinal identificável de infecções do trato urinário e de pneumonia nos pacientes idosos. Deve-se obter uma urinálise e uma radiografia torácica como parte de cada investigação. Abscessos cerebrais também podem se apresentar como um estado mental alterado e podem ser identificados por tomografia computadorizada (TC) ou ressonância nuclear magnética (RNM) do crânio.

Sepse

Um espectro de doença. no qual existe uma resposta sistêmica e desregulada do hospedeiro a uma infecção.[19] A apresentação varia desde sintomas sutis e inespecíficos (por exemplo, indisposição com temperatura normal) a sinais graves com evidências de disfunção de múltiplos órgãos e choque séptico. Os pacientes podem apresentar sinais de taquicardia, taquipneia, hipotensão, febre ou hipotermia, enchimento capilar lentificado, pele manchada ou pálida, cianose, estado mental recém-alterado, débito urinário reduzido[17] A sepse e o choque séptico são emergências médicas.

Os fatores de risco para sepse incluem:[17]

  • idade abaixo de 1 ano

  • idade superior a 75 anos

  • fragilidade

  • imunidade comprometida (em decorrência de doenças ou medicamentos)

  • cirurgia recente ou outros procedimentos invasivos

  • qualquer quebra da integridade cutânea (por exemplo, cortes, queimaduras)

  • uso indevido de substâncias por via intravenosa

  • acessos venosos ou cateteres

  • gravidez atual ou recente.

O reconhecimento precoce da sepse é essencial porque o tratamento precoce melhora os desfechos.[17][18]​​[Evidência C][Evidência C]​ Contudo, a detecção pode ser desafiadora porque o quadro clínico da sepse pode ser sutil e inespecífico. Portanto, um limiar baixo para a suspeita de sepse é importante. A chave para o reconhecimento precoce é a identificação sistemática de qualquer paciente que tenha sinais ou sintomas sugestivos de infecção e esteja em risco de deterioração devido à disfunção orgânica. Várias abordagens de estratificação de risco foram propostas. Todas contam com uma avaliação clínica estruturada e o registro dos sinais vitais do paciente.[17][20][21]​​​[22][23]​​É importante consultar as orientações locais para obter informações sobre a abordagem recomendada pela sua instituição. A cronologia das investigações e tratamentos deve ser orientada por essa avaliação inicial.[22]

A Surviving Sepsis Campaign produziu diretrizes de tratamento que constituem ainda hoje o padrão mais amplamente aceito.[18][24] O tratamento recomendado para os pacientes com suspeita de sepse é:

  • Meça o nível de lactato e realize novamente a medição caso o lactato inicial esteja elevado (>2 mmol/L [>18 mg/dL]).

  • Obtenha hemoculturas antes de administrar antibióticos.

  • Administrar antibióticos de amplo espectro (com cobertura para Staphylococcus aureus resistente à meticilina [MRSA], se houver alto risco de MRSA) para adultos com possível choque séptico ou alta probabilidade de sepse.

  • Para adultos com sepse ou choque séptico com alto risco de infecção fúngica, deve-se administrar terapia antifúngica empírica.

  • Comece uma administração rápida de cristaloides se houver hipotensão ou um nível de lactato ≥4 mmol/L (≥36 mg/dL). Consulte os protocolos locais.

  • Administre vasopressores por via periférica se o paciente estiver hipotenso durante ou após a ressuscitação fluídica para manter uma PAM ≥65 mmHg, em vez de protelar o início até que um acesso venoso central esteja assegurado. A noradrenalina é o vasopressor de escolha.

  • Para os adultos com insuficiência respiratória hipoxêmica induzida por sepse, deve-se administrar oxigênio nasal de alto fluxo.

Idealmente, essas intervenções devem começar na primeira hora após a identificação da sepse.[24]

Para pacientes com possível sepse sem choque, se a preocupação relativa à infecção persistir, deve-se administrar antibióticos até 3 horas após o reconhecimento inicial de sepse.[18] Para adultos com baixa probabilidade de infecção e sem choque, os antibióticos podem ser postergados e pode-se continuar monitorando o paciente rigorosamente.[18]

Para obter mais informações sobre sepse consulte nossos tópicos [Tópico relacionado: Sepse em adultos] e [Tópico relacionado: Sepse em crianças].

Gastrointestinal

A apendicite e a isquemia mesentérica aguda são emergências cirúrgicas que podem ser fatais se não identificadas e tratadas.

A apendicite causa dor abdominal periumbilical constante, que, posteriormente, migra para o quadrante inferior direito. Geralmente, a dor piora com o movimento. Anorexia, náuseas e vômitos são comuns. Um sinal clássico é o desconforto abdominal no quadrante inferior direito (sinal de McBurney). Pode haver dor à descompressão brusca, principalmente se o apêndice for anterior. O objetivo do tratamento é remover o apêndice infectado. Uma vez feito o diagnóstico de apendicite aguda, não se deve administrar nada por via oral aos pacientes. Fluidos de manutenção por via intravenosa devem ser iniciados, e a apendicectomia devem ser realizada sem demora.

A maioria dos pacientes com doença intestinal isquêmica sente dor, que pode variar dependendo do tipo e do segmento do intestino envolvido. A hematoquezia, a melena e a diarreia ocorrem com frequência. A dor sentida pode ser desproporcional ao desconforto à palpação observado ao exame físico. A ressuscitação fluídica adequada e o oxigênio suplementar devem ser administrados para otimizar a perfusão e a oxigenação dos tecidos. A ressuscitação inicial também deve aliviar qualquer insuficiência cardíaca aguda e corrigir qualquer arritmia. O monitoramento invasivo e o suporte inotrópico podem ser apropriados. O status de jejum deve ser imposto, com descompressão via sonda nasogástrica para o alívio sintomático.

Antibióticos empíricos adequados para cobertura entérica são administrados a todos os pacientes, de acordo com as diretrizes antimicrobianas locais, pois a isquemia pode levar a translocação bacteriana significativa devido aos danos à barreira mucosa intestinal normal.

Com o surgimento da radiologia intervencionista, o tratamento endovascular pode ser considerado para pacientes hemodinamicamente estáveis, quando disponível. Se houver sinais clínicos de peritonite, ou evidências radiográficas ou laboratoriais indicativas de infarto ou perfuração, a laparotomia exploratória ou laparoscopia deverá ser realizada com urgência e incluir a ressecção do intestino não viável.

Eventos cardíacos

A dor torácica aguda necessita de uma avaliação clínica rápida, pois a doença subjacente pode trazer risco de vida. O padrão de cuidados é o monitoramento contínuo do pulso, da pressão arterial (PA) e da saturação de oxigênio. Se o paciente estiver com dor ou falta de ar, ou a saturação de oxigênio for <90%, deve ser fornecido oxigênio em sistema de alto fluxo. A morfina (intravenosa) também pode ser necessária para aliviar a dor intensa.

As investigações iniciais incluem eletrocardiograma (ECG) de 12 derivações, radiografia torácica, biomarcadores cardíacos, hemograma completo e perfil renal. O paciente pode necessitar ser transferido para um ambiente de terapia intensiva. Quando o paciente estiver estável, testes adicionais, como uma cintilografia de ventilação/perfusão, ecocardiograma, tomografia computadorizada (TC) ou angiografia devem ser solicitados para se confirmar a suspeita clínica.

Eventos psiquiátricos

A avaliação do paciente com psicose aguda inclui a anamnese e o exame físico completos, assim como exames laboratoriais. Com base nos achados iniciais, outros testes diagnósticos podem ser necessários. Causas orgânicas devem ser consideradas e excluídas antes da psicose ser atribuída a um transtorno psicótico primário. A causa mais comum da psicose aguda é a toxicidade medicamentosa de uso recreativo, prescrito ou de venda livre. Os pacientes com doenças estruturais do cérebro, ou com um processo tóxico ou metabólico que apresentam psicose, geralmente têm outras manifestações físicas que são facilmente detectáveis por história, exame neurológico ou exames de rotina laboratorial.

Distúrbios respiratórios

O estado mental alterado está comumente associado à hipóxia, que geralmente é secundária a uma doença subjacente, como infecção sistêmica, embolia pulmonar, crise de asma grave, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), insuficiência cardíaca ou arritmia, ou intoxicação por monóxido de carbono. A oximetria de pulso e a gasometria arterial podem confirmar a presença de hipóxia.

Efeitos do medicamento

É essencial estabelecer se houve início de uso de novos medicamentos, se um medicamento existente foi recentemente alterado ou se um medicamento foi interrompido abruptamente.[25] A investigação deve incluir perguntas sobre o uso de medicamentos não prescritos e o uso furtivo de álcool. A reconciliação de medicação é obrigatória no pronto-socorro, uma vez que certos estados de abstinência podem ser fatais se não observados.

Toxidromes

Deve-se solicitar a análise toxicológica (para medicamentos prescritos e substâncias ilícitas) e nível de álcool sempre que houver suspeita de abuso de substâncias. A intoxicação acidental deve ser considerada em todas as crianças com alterações agudas do estado mental e o manejo deve ser baseado na toxina suspeitada. As síndromes de abstinência também devem ser consideradas. É imperativo que seja realizado um diagnóstico rápido e um tratamento urgente de todas as síndromes tóxicas. Deve-se considerar o uso de substâncias ilícitas (por exemplo, opiáceos, anfetamina e abuso de benzodiazepínicos).

Endocrinopatias

O coma mixedematoso ocorre tipicamente em pacientes mais idosos com hipotireoidismo subjacente. A crise adrenal pode ocorrer em pacientes com doença de Addison, durante estresse, trauma ou infecção, ou, mais geralmente, naqueles que tomam corticosteroides. Os testes de função tireoidiana e os níveis de cortisol sérico devem ser considerados parte da investigação para o estado mental alterado.

A crise adrenal deve ser tratada imediatamente, mesmo se um diagnóstico laboratorial ainda não tiver sido estabelecido. Administra-se hidrocortisona intravenosa se houver suspeita clínica de crise adrenal.

Fluidoterapia intravenosa deve ser administrada para corrigir a hipotensão e desidratação. Isso pode ser o componente mais importante na ressuscitação imediata de um paciente criticamente enfermo. O monitoramento cuidadoso da pressão arterial (PA) e dos níveis de sódio e potássio deve ser mantido. Glicose deve ser administrada quando necessária para corrigir a hipoglicemia, mas deve-se tomar cuidado para evitar o agravamento da hiponatremia. Nesse sentido, o uso de soro fisiológico com dextrose a 5% é útil.

Anormalidades metabólicas

Os pacientes com casos de anormalidades de sódio, potássio e cálcio com risco de vida podem apresentar estado mental alterado. As anormalidades metabólicas podem ser secundárias à doença renal ou doença hepática. Uma investigação metabólica é essencial.

Anormalidades de glicose

A hipoglicemia e a hiperglicemia podem apresentar confusão mental e consciência reduzida. A glicose plasmática deve ser o primeiro teste para qualquer paciente que apresente estado mental alterado, uma vez que pode ser medida de forma rápida e simples, além de ser facilmente tratável. Se não for possível realizar o exame imediatamente, deve-se administrar glicose empiricamente.

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